Rodolphe ouvira tantas vezes dizer tais coisas que elas nada mais tinham de original para ele. Emma assemelhava-se a todas as suas amantes; e o encanto da novidade, caindo pouco a pouco como uma veste, deixava ver a nu a eterna monotonia da paixao que tem sempre as mesmas formas e a mesma linguagem. Aquele homem tao experiente nao distinguia mais a diferenca dos sentimentos sob a igualdade das expressoes. Porque labios libertinos ou venais lhe haviam murmurado frases semelhantes, ele mal acreditava em sua candura; era preciso, pensava, descontar suas palavras exageradas, escondendo as afeicoes mediocres: como se a plenitude da alma nao transbordasse algumas vezes nas metaforas mais vazias, ja que ninguem pode algum dia exprimir exatamente suas necessidades ou seus conceitos, nem suas dores e ja que a palavra humana e como um caldeirao rachado, no qual batemos melodias proprias para fazer dancas os ursos quando desejariamos enternecer as estrelas. Porem, com a superioridade critica de quem, em qualquer compromisso, se mantem na retaguarda, Rodolphe percebeu naquele amor a possibilidade de explorar outros gozos. Julgou todo pudor como algo incomodo. Tratou-a sem cerimonia. Fez dela algo de maleavel e de corrompido. Era uma especie de afeto idiota cheio de admiracao para ele, de volupia para ela, uma beatitude que a entorpecia; e sua alma afundava naquela embriaguez e nela se afogava, encarquilhada (...)