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Naquela noite, enquanto esperava (bordando, vendo a neve cair, ouvindo Chopin e Elgar) que meu ingles apaixonado e instavel aparecesse, eu de repente me conscientizei de como a musica me parecia clara e tocante; como era de uma beleza extrema e melancolica o fato de eu observar a neve e esperar por ele. Eu estava sentindo mais beleza, mas tambem mais tristeza de verdade. Quando ele surgiu - elegante, acabando de chegar de um jantar de cerimonia, de smoking, com uma echarpe de seda branca jogada de qualquer jeito em volta do pescoco e uma garrafa de champanhe na mao - pus para tocar a sonata postuma para piano em si-bemol, D. 960, de Schubert. Seu erotismo belissimo e obsessivo me encheu de emocao e me fez chorar. Chorei pela contundencia de toda a emocao que eu havia perdido sem saber, e chorei pelo prazer de voltar a vivencia-la. Ate hoje, nao consigo ouvir essa obra sem me sentir cercada pela linda tristeza daquela noite, pelo amor que eu tinha o privilegio de conhecer e pela lembranca do equilibrio precario que existe entre a sanidade e um sufocamento sutil e terrivel dos sentidos.