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O alegre e claro espelho de minha alma era muitas vezes embacado por uma especie de melancolia mas, por ora, nao havia sido seriamente danificado. Ela aparecia de tempos em tempos, durante um dia ou uma noite, como uma tristeza sonhadora e solitaria; desaparecia depois sem deixar tracos, voltando apos algumas semanas ou meses. Aos poucos fui me habituando a ela, como a uma amiga e confidente, nao a recebendo como um tormento, mas como um cansaco inquieto, que nao deixava de ter seu encanto. Quando ela me surpreendia de noite eu ficava, em vez de dormir, horas inteiras a janela, olhava o lago mergulhado na escuridao, as silhuetas das montanhas desenhadas no palor do ceu e bem no alto, as belas estrelas. Entao apossava-se de mim com frequencia um sentimento doce e vigoroso, como se eu fosse contemplado por toda aquela formosura da noite, com uma justa censura. Como se estrelas, montanhas e lagos aspirassem por alguem que compreendesse sua beleza e o sofrimento da sua natureza calada e a expressasse, como se eu fosse aquele ser e como se fosse essa a minha verdadeira missao. a de dar, em poesias, uma expressao a natureza muda. De que maneira isso seria possivel nao sei, jamais pensei nisso, apenas sentia que a bela e severa noite esperava por mim, impaciente, numa ansia silente. (p. 42)