"-- Nao brinco, nao. Digo apenas o que percebi. Os conhecimentos podem ser transmitidos, mas nunca a sabedoria. Podemos acha-la; podemos vive-la; podemos consentir em que ela nos norteie; podemos fazer milagres atraves dela. Mas nao nos e dado pronuncia-la e ensina-la. (...) Uma percepcao me veio, o Govinda, que talvez te afigure novamente como uma brincadeira ou uma bobagem. Reza ela: "O oposto de cada verdade e igualmente verdade". Isso significa: uma verdade so podera ser comunicada e formulada por meio de palavras, quando for unilateral. Ora, unilateral e tudo quanto possamos apanhar pelo pensamento e exprimir pela palavra. Tudo aquilo e apenas um lado das coisas, nao passa de parte, carece de totalidade, esta incompleto, nao tem unidade. Sempre que o augusto Gautama nas suas aulas nos falava do mundo, era preciso que o subdividisse em Sansara e Nirvana, em ilusao e verdade, em sofrimento e redencao. Nao se pode proceder de outra forma. Nao ha outro caminho para quem quiser ensinar. Mas o proprio mundo, o ser que nos rodeia e existe no nosso intimo, nao e nunca unilateral. Nenhuma criatura humana, nenhuma acao e inteiramente Sansara nem inteiramente Nirvana. Homem algum e totalmente santo ou totalmente pecador. Uma vez que facilmente nos equivocamos, temos a impressao de que o tempo seja algo real. Nao, Govinda, o tempo nao e real, como verifiquei em muitas ocasioes. E se o tempo nao e real, nao passa tampouco de ilusao aquele lapso que nos parece estender-se entre o mundo e a eternidade, entre o tormento e a bem-aventuranca, entre o Bem e o Mal."