PorCap - Ecclesiastes

Chapter 1

1:1  *Palavras de Qohélet, filho de David, rei em Jerusalém.

1:2  *Ilusão das ilusões – disse Qohélet – ilusão das ilusões: tudo é ilusão.

1:3  *Que proveito pode tirar o homem de todo o esforço que faz debaixo do Sol?

1:4  Uma geração passa, outra vem; e a terra permanece sempre.

1:5  O Sol nasce e o Sol põe-se e visa o ponto donde volta a despontar.

1:6  O vento vai em direção ao sul, depois ruma ao norte; e gira, torna a girar e passa, e recomeça as suas idas e vindas.

1:7  Todos os rios correm para o mar, e o mar não se enche. Para onde sempre correram, continuam os rios a correr.

1:8  *Todas as palavras estão gastas, o homem não consegue já dizê-las. A vista não se sacia com o que vê, nem o ouvido se contenta com o que ouve.

1:9  Aquilo que foi é aquilo que será; aquilo que foi feito, há de voltar a fazer-se: e nada há de novo debaixo do Sol!

1:10  Se de alguma coisa alguém diz: «Eis aí algo de novo!», ela já existia nas eras que nos precederam.

1:11  Não há memória das coisas antigas; e também não haverá memória do que há de suceder depois; nem ficará disso memória entre aqueles que hão de vir mais tarde.

1:12  *Eu, Qohélet, fui rei de Israel, em Jerusalém,

1:13  apliquei o meu espírito a estudar e a explorar, pela sabedoria, todas as coisas que sucedem debaixo do céu. É uma tarefa ingrata que Deus deu aos homens e os oprime.

1:14  Vi tudo o que se faz debaixo do Sol e achei que tudo é ilusão e correr atrás do vento.

1:15  *O que é torto não se pode endireitar e o que é falho não se pode completar.

1:16  Disse no meu coração: «Eu reuni e acumulei em sabedoria mais do que todos os que, antes de mim, governaram Jerusalém, e o meu coração penetrou muito profundamente na sabedoria e no conhecimento.»

1:17  Apliquei, igualmente, o meu coração a conhecer a sabedoria, a loucura e a insensatez; e reconheci que também isto é correr atrás do vento.

1:18  *Porque na muita sabedoria há muita arrelia, e o que aumenta o conhecimento, aumenta o sofrimento.

Chapter 2

2:1  *Eu disse em meu coração: «Vem! Quero fazer-te experimentar a alegria; saboreia a felicidade.» E eis que também isto é ilusão.

2:2  Do riso eu disse: «Loucura!» e da alegria: «Para que serve?»

2:3  *Resolvi, em meu coração, entregar-me ao vinho; embora o meu coração se norteasse ainda pela sabedoria; aferrei-me à loucura até ver o que convém aos filhos dos homens, ou que devem eles fazer debaixo do céu nos limitados dias da sua vida.

2:4  Multipliquei os meus empreendimentos, para mim construí casas e plantei vinhas;

2:5  para mim fiz hortas e pomares, plantei neles árvores de todas as espécies de fruto;

2:6  para mim construí depósitos de água para regar o bosque onde crescem as árvores.

2:7  Comprei servos e servas; outros nasceram-me em casa. Possuí muito gado, bois e ovelhas, mais do que todos os que me precederam em Jerusalém.

2:8  Para mim amontoei prata e ouro, riquezas de reis e de províncias; escolhi para mim cantores e cantoras. Enfim, as delícias dos filhos dos homens, uma mulher e mais mulheres.

2:9  Tornei-me maior e mais rico do que todos quantos me precederam em Jerusalém; mas a minha sabedoria permanecia comigo

2:10  e de tudo quanto os meus olhos desejaram, nada lhes recusei: não privei o meu coração de nenhuma alegria, pois o meu coração sentiu alegria em todas as minhas canseiras e este foi o quinhão que me ficou de todo o meu esforço.

2:11  E voltei-me para todas as obras que as minhas mãos tinham feito e para o esforço que me custou fazê-las: e eis que tudo era ilusão e correr atrás do vento e que nada havia de proveitoso debaixo do Sol.

2:12  E voltei-me para a consideração da sabedoria, da loucura e dos desvarios. Que fará o homem que sucede ao rei? O que já foi feito!

2:13  *E reconheci que a sabedoria leva vantagem sobre a loucura, como a luz leva vantagem sobre as trevas.

2:14  O sábio tem os olhos na testa, mas o insensato anda nas trevas. E reconheci também que a todos eles espera a mesma sorte.

2:15  E eu disse em meu coração: «A sorte do insensato tocar-me-á a mim também. Para que serve a minha sabedoria?» Então, decretei em meu coração que também isto é ilusão.

2:16  Pois não há memória que dure sempre nem para o sábio nem para o insensato; antes, passado algum tempo, tudo igualmente se esquece. Mas então? Tanto morre o sábio como o insensato!

2:17  Odiei a vida, pois é mau para mim quanto se faz debaixo do Sol. Tudo é ilusão e correr atrás do vento.

2:18  E odiei todos os esforços que suportei debaixo do Sol, porque tudo hei de deixar àquele que virá depois de mim.

2:19  E quem sabe se esse será sábio ou insensato? Mas é ele quem será senhor de todo o fruto dos meus esforços que debaixo do Sol me custaram trabalho e sabedoria. Também isto é ilusão.

2:20  Desesperei em meu coração de todo o trabalho que suportei debaixo do Sol.

2:21  Porque há quem se esforce com sabedoria, conhecimento e bom êxito, para deixar o fruto do seu labor a outro que não se esforçou. Também isto é ilusão e grande mal.

2:22  Pois que resta ao homem de todo o seu esforço, de toda a azáfama com que se afadigou debaixo do Sol?

2:23  Todos os seus dias são apenas dor e todo o seu trabalho, apenas arrelia; mesmo durante a noite o seu coração não se aquieta. E também isto é ilusão.

2:24  *Nada há de melhor para o homem do que comer e beber e gozar o bem-estar, fruto do seu trabalho. Mas notei também que isto vem da mão de Deus.

2:25  Quem, com efeito, come e bebe senão graças a Ele?

2:26  Àquele que lhe é agradável, Deus dá sabedoria, conhecimento e alegria; mas, ao pecador, dá o cuidado de recolher e acumular bens, para depois os deixar a quem Deus quiser. E também isto é ilusão e correr atrás do vento.

Chapter 3

3:1  *Para tudo há um momento e um tempo para cada coisa que se deseja debaixo do céu:

3:2  tempo para nascer e tempo para morrer, tempo para plantar e tempo para arrancar o que se plantou,

3:3  tempo para matar e tempo para curar, tempo para destruir e tempo para edificar,

3:4  tempo para chorar e tempo para rir, tempo para se lamentar e tempo para dançar,

3:5  tempo para atirar pedras e tempo para as juntar, tempo para abraçar e tempo para evitar o abraço,

3:6  tempo para procurar e tempo para perder, tempo para guardar e tempo para atirar fora,

3:7  tempo para rasgar e tempo para coser, tempo para calar e tempo para falar,

3:8  tempo para amar e tempo para odiar, tempo para guerra e tempo para paz.

3:9  *Que proveito tira das suas fadigas aquele que trabalha?

3:10  *Eu vi a tarefa que Deus impôs aos filhos dos homens para que dela se ocupem.

3:11  Todas as coisas que Deus fez, são boas a seu tempo. Até a eternidade colocou no coração deles, sem que nenhum ser humano possa compreender a obra divina do princípio ao fim.

3:12  *Eu concluí que nada é melhor para o homem do que folgar e procurar a felicidade durante a sua vida.

3:13  Todo o homem que come e bebe e encontra felicidade no seu trabalho, tem aí um dom de Deus.

3:14  *Reconheci que tudo o que Deus faz é para sempre, sem que se possa acrescentar ou tirar nada. Deus procede de maneira a ser temido.

3:15  Aquilo que é já existiu, e aquilo que há de ser já antes foi; Deus vai à procura daquilo que não se encontrou.

3:16  *E eu vi ainda, debaixo do Sol, a injustiça ocupar o lugar do direito e a iniquidade ocupar o lugar da justiça.

3:17  *Então eu disse em meu coração: «Deus julgará o justo e o ímpio, pois há tempo para todas as coisas e tempo para todas as obras.»

3:18  *E disse em meu coração acerca dos filhos dos homens: «Deus põe-nos à prova, para lhes mostrar que, só por si, são semelhantes aos animais.

3:19  *Porque é o mesmo o destino dos filhos dos homens e o destino dos animais; um mesmo fim os espera. Como a morte de um assim é a morte do outro. A ambos foi dado o mesmo sopro, e o homem não tem qualquer vantagem sobre o animal, pois tudo é ilusão.

3:20  Todos vão para um mesmo lugar. Todos saíram do pó e ao pó hão de voltar todos.

3:21  *Quem sabe se o sopro de vida dos filhos dos homens subirá às alturas, e o sopro de vida dos animais descerá ao fundo da terra?

3:22  *E reconheci que não há felicidade maior para o homem do que alegrar-se com as suas obras. Este é o quinhão que lhe toca. Pois quem o trará de volta para ver o que acontecerá depois dele?»

Chapter 4

4:1  *E, de novo, considerei todas as opressões que se cometem debaixo do Sol. Vede as lágrimas dos oprimidos: eles não têm consolador. Os seus opressores fazem-lhes violência: eles não têm consolador.

4:2  E eu, então, felicitei aqueles que já morreram, de preferência aos vivos que ainda estão vivos.

4:3  E mais felizes que uns e outros são os que nunca chegaram à existência e não viram o mal que se comete debaixo do Sol.

4:4  *Vi também que todo o esforço e todo o êxito de uma obra não passam de inveja de uns para com os outros. Também isto é ilusão e correr atrás do vento.

4:5  O insensato cruza os braços e devora-se a si mesmo:

4:6  «Mais vale um punhado de lazer, do que duas mãos cheias de esforço e correr atrás do vento.»

4:7  Vi ainda outra ilusão debaixo do Sol:

4:8  eis um homem só, sem ninguém junto de si, não tem filho, nem irmão; mas não cessa de se esforçar, nem os seus olhos se fartam de riquezas: «Para quem me esforço eu, privando-me de coisas boas?» Também isto é ilusão e tarefa ingrata.

4:9  *É melhor dois do que um só: tirarão melhor proveito do seu esforço.

4:10  Se caírem, um ergue o seu companheiro. Mas ai do solitário que cai: não tem outro para o levantar!

4:11  E se dormirem dois juntos, dormem quentes; mas se alguém está só, como se há de aquecer?

4:12  Se um só é oprimido, dois já conseguem resistir a isso; o cordel dobrado em três não se parte facilmente.

4:13  Vale mais um jovem pobre, mas sábio, do que um rei velho, mas insensato, que já não sabe aceitar conselhos.

4:14  Mesmo que tenha saído da prisão para reinar, mesmo que tenha nascido pobre no seu reino,

4:15  vi todos os seres vivos que andam debaixo do Sol acompanhar o jovem que ia suceder ao rei.

4:16  Era interminável a multidão que o acompanhava, da qual ele se tornara chefe. Mas a geração seguinte não se regozijará nele. Tudo isto é ilusão e correr atrás do vento.

4:17  *Vê onde pões os pés, quando entras na casa de Deus. Aproxima-te para escutar; isto vale mais do que o sacrifício dos insensatos, pois eles não sabem que fazem o mal.

Chapter 5

5:1  Não digas nada inconsideradamente nem o teu coração se apresse a proferir palavras diante de Deus, pois Deus está no céu, e tu, na terra; sejam, portanto, poucas as tuas palavras.

5:2  Os sonhos vêm das muitas ocupações, os despropósitos, do muito falar.

5:3  Se fizeste um voto a Deus, trata de o cumprir sem demora, porque aos insensatos Deus não é favorável. Cumpre, pois, tudo o que tiveres prometido.

5:4  É melhor não prometeres do que prometeres e não cumprires.

5:5  *Não permitas à tua língua que te torne culpado, nem digas ao mensageiro de Deus que foi apenas uma inadvertência, para que não suceda que Deus se irrite com as tuas palavras e reduza a nada as obras das tuas mãos.

5:6  Muitos sonhos geram muitas ilusões e muitas palavras. Tu, porém, teme a Deus.

5:7  *Se vires na tua terra a opressão do pobre, ou a violação do direito e da justiça, não te admires, porque o que está alto tem acima de si outro mais alto, e sobre ambos há ainda outro mais elevado.

5:8  O proveito da terra é para todos; o rei é servido dos campos cultivados.

5:9  *Aquele que ama o dinheiro nunca se saciará do dinheiro, e aquele que ama a riqueza, a riqueza não virá ao seu encontro. Também isto é ilusão.

5:10  Onde abundam os bens, abundam os que os devoram. E que vantagem tem o dono dos bens além de vê-los com os seus olhos?

5:11  Doce é o sono do trabalhador, quer tenha comido pouco ou muito; mas a abundância do rico não o deixa dormir descansado.

5:12  Vi outra dolorosa miséria debaixo do Sol: a riqueza entesourada para desgraça do seu dono.

5:13  Perdem-se essas riquezas num mau negócio, e se tiver um filho, este fica sem nada nas mãos.

5:14  Assim como saiu nu do ventre de sua mãe, de novo nu partirá como veio, e nada levará do seu esforço, nada nas mãos quando se for.

5:15  Sim, é uma dolorosa miséria que tal como veio, assim irá. De que lhe serve ter-se esforçado para o vento?

5:16  Não consumirá todos os seus dias nas trevas, na aflição, no sofrimento e no azedume?

5:17  *Compreendi que é belo e bom comer e beber, e sentir-se feliz em todo o esforço que se tem de fazer debaixo do Sol, nos breves dias de vida que Deus concede ao homem. Esta é a sua sorte.

5:18  Se Deus dá ao homem bens e riquezas e a possibilidade de usufruir deles, de desfrutar da sua parte e viver alegre no seu esforço, isso é um dom de Deus.

5:19  Não pensará muito nos dias da sua vida, porque Deus lhe concede a alegria de coração.

Chapter 6

6:1  *Vi ainda outro mal debaixo do Sol e que pesa grandemente sobre o homem:

6:2  um homem, a quem Deus deu bens, riquezas e honras, a quem nada falta de quantas coisas deseja, mas a quem Deus não permite gozar delas; antes, virá um estranho que há de devorar tudo. Isto é ilusão e grande dor.

6:3  *Um homem, embora crie uma centena de filhos e viva muitos anos e numerosos dias, se a sua alma não se saciou de felicidade e se foi privado de sepultura, não duvido afirmar que mais feliz do que ele é um aborto.

6:4  Porque este veio ao mundo em vão e vai para as trevas, e o seu nome permanecerá nas trevas;

6:5  não viu o Sol nem o conhece; cai daqui para ali.

6:6  E mesmo que alguém vivesse dois mil anos, não veria a felicidade. Acaso não vão todos para o mesmo lugar?

6:7  *Todo o esforço do homem é para a sua boca, mas o seu apetite nunca se satisfaz.

6:8  Qual é a superioridade do sábio sobre o insensato? Qual a vantagem do pobre que sabe conduzir-se na vida?

6:9  Melhor é o que veem os olhos do que a agitação dos desejos. Mas também isto é ilusão e correr atrás do vento.

6:10  Tudo o que existiu já teve um nome e sabe-se o que é um homem. Mas ele não pode disputar contra quem é mais forte do que ele.

6:11  Onde há muitas palavras, há muita ilusão. Que aproveita o homem com isso?

6:12  E quem pode saber o que é melhor para o homem na vida, durante os limitados dias da sua vã existência que passa como a sombra? Ou quem poderá dizer ao homem o que acontecerá depois dele debaixo do Sol?

Chapter 7

7:1  *Mais vale um bom nome do que um bom perfume, mais vale o dia da morte que o dia do nascimento.

7:2  Mais vale ir a uma casa em luto do que a uma casa em festa, pois esse é o fim de todo o homem: que os vivos meditem nele no seu coração.

7:3  Mais vale a tristeza do que o riso, porque a tristeza do rosto é boa para o coração.

7:4  O coração dos sábios está na casa do luto; o coração dos insensatos, na casa da alegria.

7:5  Mais vale ouvir a reprimenda de um sábio do que a cantilena dos insensatos.

7:6  Tal como o crepitar dos gravetos sob a caldeira, assim é o riso do insensato. Também isto é ilusão.

7:7  Pois a opressão torna o sábio insensato e o suborno corrompe o coração.

7:8  É melhor o fim de uma coisa do que o seu princípio; mais vale a paciência do que a arrogância.

7:9  Não sejas fácil em irar-te, porque a ira se aninha nas entranhas dos insensatos.

7:10  Não digas: «Porque foram os dias antigos melhores que os de agora»? Pois não é a sabedoria que te inspira essa pergunta.

7:11  *Bom é ter sabedoria e, também, ter uma herança. Isso é vantajoso para os que veem o Sol.

7:12  A sabedoria protege-nos e o dinheiro também nos protege, mas a sabedoria tem a vantagem de dar vida aos que a possuem.

7:13  Considera as obras de Deus: quem poderá endireitar o que Ele deixou ficar torto?

7:14  No dia da felicidade, sê alegre; no dia da desgraça, reflete, pois Deus fez uma a par da outra, a fim de que o homem não descubra o que depois lhe irá acontecer.

7:15  *Vi tudo isto no decurso da minha vã existência: há um justo que morre apesar da sua justiça, e há um mau que continua a viver, apesar da sua malícia.

7:16  Não queiras ser excessivamente justo nem demasiado sábio: para quê arruinares-te?

7:17  Não faças demasiado mal e não sejas insensato. Porque hás de querer morrer, antes da tua hora?

7:18  Bom é que guardes isto e não negligencies aquilo, pois aquele que teme a Deus ultrapassa tudo isso.

7:19  A sabedoria dá ao sábio uma força superior à de dez chefes de guerra reunidos numa cidade.

7:20  Não há homem justo sobre a terra que faça o bem e não peque.

7:21  Não prestes atenção a todas as palavras que se dizem, para que não ouças o teu servo falar mal de ti.

7:22  A tua consciência sabe que também tu, muitas vezes, tens falado mal dos outros.

7:23  Tudo isto eu quis experimentar a respeito da sabedoria. Disse: Alcancei a sabedoria; mas ela está longe de mim.

7:24  Continua distante o que estava distante, e profundo, o que estava profundo: quem o poderá sondar?

7:25  Apliquei todo o meu coração a explorar e a buscar sabedoria e inteligência, a reconhecer que o malvado é um louco e a insensatez, uma demência.

7:26  *Eu considero que mais amargo do que a morte é encontrar uma mulher que é uma armadilha, cujo coração é uma rede, e cujas mãos são cadeias. Aquele que é agradável a Deus fugirá dela, mas o pecador será apanhado por ela.

7:27  Eis o que eu concluí – disse Qohélet – após ter examinado uma coisa depois da outra, para lhes encontrar o sentido.

7:28  Eis o que a minha alma ainda busca e não descobre: entre mil homens achei um, e entre todas as mulheres nem uma só achei.

7:29  *Somente descobri isto: Deus criou os homens retos, eles, porém, procuraram maquinações sem fim.

Chapter 8

8:1  Quem se pode comparar ao sábio? Quem conhece a razão das coisas? A sabedoria do homem alegra o seu rosto e abranda a dureza da sua face.

8:2  *Cumpre a ordem do rei, por causa do juramento feito a Deus.

8:3  Não te apresses a fugir da sua presença, não teimes em praticar o que lhe desagrada, porque o rei pode fazer tudo o que lhe apraz.

8:4  *Pois a palavra do rei é soberana; quem lhe pode dizer: «Que fazes tu?»

8:5  Aquele que observa o preceito não experimentará mal algum; o coração do sábio conhece o tempo e o julgamento.

8:6  Todas as coisas têm o seu tempo e o seu julgamento, mas é grande a aflição que pesa sobre o homem.

8:7  Ele não conhece o futuro; quem lhe poderá dizer como as coisas se passarão?

8:8  Ninguém é senhor do seu sopro de vida, nem é capaz de o conservar. Ninguém tem poder sobre o dia da sua morte, nem faculdade de afastar esse combate; nem ao ímpio o poderá salvar a sua impiedade.

8:9  Vi tudo isto e apliquei o meu espírito a considerar tudo o que se faz debaixo do Sol, num tempo em que um homem domina outro homem para lhe fazer mal.

8:10  E, então, vi ímpios a receberem sepultura, e vinham do templo glorificá-los na cidade: mas também isto é ilusão.

8:11  Porque a sentença contra o que pratica o mal não é executada imediatamente, então, o coração dos homens enche-se de desejos de fazer mal.

8:12  *Ainda que o pecador cometa cem vezes o mal, ele vê a sua vida prolongada. Sei, no entanto, que a felicidade é para os que temem a Deus e se enchem de respeito na sua presença.

8:13  Não haverá felicidade para o mau; tal como a sombra que passa, não poderá prolongar a sua vida, pois, na presença de Deus, não mostra temor.

8:14  Há ainda outra ilusão sobre a terra: há justos que são tratados como se tivessem sido ímpios; e há ímpios que são tratados como se tivessem sido justos. Declaro que também isto é ilusão.

8:15  Por isso, louvei a alegria, visto não haver nada de melhor para o homem, debaixo do Sol, do que comer, beber e divertir-se; é isto que o acompanha no seu trabalho, durante os dias que Deus lhe conceder debaixo do Sol.

8:16  Quando apliquei o meu espírito ao estudo da sabedoria e à observação das coisas que se passam sobre a terra, vi que há homens que nem de dia nem de noite deixam adormecer os seus olhos,

8:17  e contemplei toda a obra de Deus, e vi que o homem não pode descobrir tudo o que se faz debaixo do Sol. Ele afadiga-se a investigar, mas não encontra nada; e mesmo o sábio, se pretender conhecer, não conseguirá descobrir.

Chapter 9

9:1  *Apliquei, então, o meu espírito ao esclarecimento de tudo isto, e vi que os justos, os sábios e as suas obras estão na mão de Deus. Nem o amor nem o ódio o homem consegue discernir: no entanto, ambos estão diante dele.

9:2  Tudo acontece igualmente a todos: a mesma sorte para o justo e para o ímpio, para o bom e puro e para o impuro, para o que oferece sacrifícios e para o que não oferece. O homem bom é tratado como o pecador; o perjuro como aquele que cumpre o juramento.

9:3  Eis o pior mal, no meio de tudo o que se realiza debaixo do Sol: que haja para todos um mesmo destino. Por isso, o espírito dos homens transborda de malícia, e a loucura habita no seu coração durante a vida; e depois, todos eles vão para junto dos mortos.

9:4  *E o que será melhor? Para todos os vivos há uma coisa certa: mais vale um cão vivo que um leão morto.

9:5  Os que estão vivos sabem que hão de morrer, mas os mortos não sabem nada, nem para eles há ainda retribuição, pois a sua lembrança foi esquecida.

9:6  O seu amor, ódio e inveja pereceram juntamente com eles; e nunca mais terão parte em tudo quanto se faz debaixo do céu.

9:7  *Vai, come o teu pão com alegria e bebe com prazer o teu vinho, porque a Deus agradam as tuas obras.

9:8  Veste-te sempre com vestidos brancos, e haja sempre óleo perfumado na tua cabeça.

9:9  Goza a vida com a mulher que amas, durante todos os dias da tua fugaz existência que Deus te concede debaixo do Sol. Esta é a tua parte na vida, entre os trabalhos que suportas debaixo do Sol.

9:10  Tudo o que a tua mão possa fazer, fá-lo com todas as tuas faculdades, pois na região dos mortos para onde irás, não há trabalho nem inteligência, não há ciência nem sabedoria.

9:11  *Descobri ainda, debaixo do Sol, que a corrida não é para os ágeis, nem a batalha para os bravos, nem o pão para os prudentes, nem a riqueza para os doutos, nem o favor para os sábios: todos estão à mercê das circunstâncias e da sorte.

9:12  O homem não conhece a sua própria hora: como os peixes apanhados na rede fatal, como os passarinhos que caem no laço, assim os homens são surpreendidos na hora da adversidade, quando ela cair sobre eles de improviso.

9:13  Vi também, debaixo do Sol, este facto, que foi para mim uma grande lição:

9:14  havia uma cidade pequena, pouco populosa, contra a qual veio um grande rei, que a sitiou e levantou contra ela grandes fortificações.

9:15  Ora encontrava-se nela um homem pobre e sábio, cuja sabedoria salvou a cidade. Mas ninguém mais se lembrou deste homem pobre.

9:16  Por isso, eu disse: A sabedoria vale mais que a força, mas a sabedoria do pobre é desprezada, e não são ouvidas as suas palavras.

9:17  As palavras calmas dos sábios são mais ouvidas do que os gritos de um chefe entre os insensatos.

9:18  Vale mais a sabedoria do que as máquinas de guerra. Mas um só pecador pode destruir muita coisa boa.

Chapter 10

10:1  *Uma mosca morta infeta e estraga o azeite perfumado. Um pouco de loucura é suficiente para corromper a sabedoria.

10:2  *O coração do sábio vai para a sua direita; o coração do insensato, para a sua esquerda.

10:3  Enquanto percorre o seu caminho, ao insensato, falta-lhe o entendimento e diz de cada um: «É louco!»

10:4  Se a ira do príncipe se inflamar contra ti, não abandones o teu posto, porque a calma evita grandes males.

10:5  Há um mal que eu vi debaixo do Sol, derivado de um desacerto da parte do soberano:

10:6  o insensato ocupa os mais altos cargos e os homens de valor estão colocados nos postos inferiores.

10:7  Vi escravos montar a cavalo e príncipes andar a pé, como escravos.

10:8  Aquele que abre uma cova, poderá cair nela; quem derruba um muro, poderá ser mordido por uma serpente.

10:9  O que transporta pedras poderá ser magoado por elas; aquele que racha lenha corre o risco de se ferir.

10:10  *Se o ferro estiver embotado e não for a amolar, é preciso redobrar esforços. O êxito será recompensa da sabedoria.

10:11  Se a serpente não ficar encantada e morder, não há proveito para o encantador.

10:12  As palavras dos sábios são apreciadas, mas os lábios dos insensatos serão a sua perdição.

10:13  As suas primeiras palavras são uma estupidez e o fim do seu discurso é um desvario.

10:14  O insensato multiplica as palavras; o homem ignora o seu futuro, e quem lhe poderá dizer o que há de acontecer depois dele?

10:15  *O trabalho do insensato cansa-o, pois não sabe ir até à cidade.

10:16  *Ai de ti, país, que tens como rei um menino e cujos príncipes se banqueteiam desde a manhã.

10:17  Feliz de ti, país, que tens um rei de família nobre e cujos príncipes comem no tempo devido, para se alimentarem e não para se embriagarem.

10:18  *Pelo desleixo cede a trave do teto, e, pela negligência, chove em casa.

10:19  Fazem-se festins para haver alegria; o vinho alegra a vida, e o dinheiro serve para tudo.

10:20  *Não digas mal do rei, nem mesmo em pensamento; não digas mal do rico, nem mesmo a sós, no teu quarto; porque as aves do céu transportam a voz e os pássaros repetem as palavras.

Chapter 11

11:1  *Espalha o teu pão sobre a superfície das águas; passado muito tempo, achá-lo-ás de novo.

11:2  Reparte do que tens com sete ou com oito pessoas; não sabes que calamidade pode sobrevir à terra.

11:3  Quando as nuvens estiverem carregadas, derramarão chuva sobre a terra. Quer a árvore caia para o sul ou para o norte, onde cair, aí ficará.

11:4  *Quem observa o vento, não semeia; e o que examina as nuvens, não ceifa.

11:5  Tal como desconheces o evoluir do espírito e dos ossos no ventre da mulher grávida, assim também não conheces as obras de Deus, que faz todas as coisas.

11:6  Semeia de manhã a tua semente, e de tarde não deixes as tuas mãos ociosas, porque não sabes qual das coisas resultará melhor, se esta ou se aquela, ou se ambas são igualmente úteis.

11:7  A luz é agradável e é um deleite para os olhos ver o Sol.

11:8  *Se um homem viver muitos anos, e em todos eles se alegrar, deve pensar nos dias escuros que são numerosos: tudo o que acontece é ilusão.

11:9  *Jovem, regozija-te na tua mocidade e alegra o teu coração na flor dos teus anos. Segue os impulsos do teu coração e o que agradar aos teus olhos, mas sabe que, de tudo isso, Deus te pedirá contas.

11:10  Lança fora do teu coração a tristeza, poupa o sofrimento ao teu corpo: também a meninice e a juventude são ilusão.

Chapter 12

12:1  *Lembra-te do teu Criador nos dias da tua juventude, antes que venham os dias maus e cheguem os anos, dos quais dirás: «Não sinto neles prazer algum.»

12:2  Antes que escureçam o Sol e a luz, a Lua e as estrelas, e voltem as nuvens depois da chuva;

12:3  quando os guardas da tua casa começarem a tremer, e os homens robustos, a vergar; quando as mós deixarem de moer por serem poucas, e se escurecer a vista dos que olham pela janela;

12:4  quando se fecham as portas da rua, quando enfraquece a voz do moinho, quando se acorda com o piar de um pássaro e emudecem as canções.

12:5  Então, também haverá o medo das subidas, e haverá sobressaltos no caminho, enquanto a amendoeira abre em flor, o gafanhoto engorda, e a alcaparra perde as suas propriedades. Então, o homem encaminha-se para a sua casa da eternidade, e as carpideiras percorrem as ruas;

12:6  antes que se rompa o cordão de prata e se quebre a bacia de oiro; antes que se parta a bilha na fonte, e se desenrole a roldana sobre a cisterna.

12:7  Então o pó voltará à terra de onde saiu e o espírito voltará para Deus que o concedeu.

12:8  *Ilusão das ilusões – disse Qohélet – tudo é ilusão.

12:9  *Além de ser sábio, Qohélet ensinou a ciência ao povo. Estudou, investigou e compôs numerosas sentenças.

12:10  Qohélet aplicou-se a encontrar sentenças agradáveis e a escrever com exatidão palavras de verdade.

12:11  As palavras dos sábios são como aguilhões e as coletâneas dos autores, como estacas bem cravadas que foram postas por um só pastor.

12:12  De resto, meu filho, fica prevenido: podem-se multiplicar os livros indefinidamente, mas o muito estudo é uma fadiga para o homem.

12:13  *O resumo do discurso, de tudo o que se ouviu, é este: teme a Deus e guarda os seus preceitos, porque este é o dever de todo o homem.

12:14  Deus pedirá contas, no dia do juízo, de tudo o que está oculto, quer seja bom, quer seja mau.