PorCap - Daniel

Chapter 1

1:1  *No terceiro ano do reinado de Joaquim, rei de Judá, Nabucodonosor, rei da Babilónia, veio cercar Jerusalém.

1:2  *O Senhor entregou-lhe Joaquim, rei de Judá, e uma parte dos objetos do templo; Nabucodonosor transportou-os ao país de Chinear e colocou-os na sala do tesouro dos seus deuses.

1:3  O rei deu ordem a Aspenaz, chefe dos criados, que lhe trouxesse jovens israelitas, de ascendência real ou de família nobre,

1:4  *sem qualquer defeito, formosos, dotados de toda a espécie de qualidades, instruídos, inteligentes e fortes. Seriam colocados no palácio real e Aspenaz devia ensinar-lhes as letras e a língua dos caldeus.

1:5  O rei destinou-lhes uma provisão diária de alimentos, reservada à ementa da mesa real, e do vinho que ele bebia. A formação deles havia de durar três anos, após o que entrariam ao serviço na presença do rei.

1:6  Entre estes, contavam-se Daniel, Hananias, Michael e Azarias, que pertenciam aos filhos de Judá.

1:7  *O chefe dos criados pôs-lhe novos nomes: a Daniel, o de Beltechaçar, a Hananias, o de Chadrac, a Michael, o de Mechac e a Azarias, o de Abed-Nego.

1:8  *Daniel tomou a resolução de não se manchar com o alimento do rei e com o vinho que ele bebia. Por isso, pediu ao chefe dos criados para se abster deles.

1:9  Deus fez com que o chefe dos criados acolhesse Daniel com benevolência e amabilidade.

1:10  Mas depois disse-lhe: «Temo que o rei, meu senhor, que determinou o que vós haveis de comer e beber, venha a encontrar o vosso rosto mais magro que o dos outros jovens da mesma idade e assim me exponhais a uma repreensão da parte do rei.»

1:11  Então, Daniel disse ao oficial, a quem o chefe dos criados tinha confiado o cuidado de Daniel, Hananias, Michael e Azarias:

1:12  «Por favor, faz uma experiência de dez dias com os teus servos: que se nos dê apenas legumes a comer, e água a beber.

1:13  Depois disto, compararás o nosso aspeto com o dos jovens que se alimentam das iguarias da mesa real e, conforme o que tiveres constatado, assim agirás com os teus servos.»

1:14  Concordou com esta proposta e submeteu-os à prova, durante dez dias.

1:15  Ao fim deste prazo, verificou-se que tinham melhor aspeto e estavam mais robustos que todos os jovens que comiam os acepipes da mesa real.

1:16  Como consequência, o oficial retirava as iguarias e o vinho que lhes estavam destinados e mandava que lhes servissem legumes.

1:17  A estes quatro jovens, Deus deu sabedoria e inteligência no domínio das letras e ciências. Daniel compreendia toda a espécie de visões e sonhos.

1:18  Decorrido o tempo fixado pelo rei para a apresentação dos jovens, o chefe dos criados levou-os à presença de Nabucodonosor,

1:19  que conversou com eles. De entre todos os jovens, não houve nenhum que pudesse comparar-se a Daniel, Hananias, Michael e Azarias. Por isso, entraram ao serviço na presença do rei.

1:20  *Em qualquer assunto de sabedoria e inteligência que os consultasse, o rei achava-os dez vezes superiores a todos os escribas e magos do seu reino.

1:21  *Assim viveu Daniel, até ao primeiro ano do reinado de Ciro.

Chapter 2

2:1  *No segundo ano do seu reinado, Nabucodonosor teve sonhos, que lhe agitaram tanto o espírito que perdeu o sono.

2:2  *O rei mandou chamar os escribas, os magos, os feiticeiros e os caldeus para lhos interpretarem. Eles vieram e apresentaram-se diante do rei.

2:3  Disse-lhes o rei: «Tive um sonho e o meu espírito atormentou-se, procurando o sentido deste sonho.»

2:4  Os caldeus responderam ao rei em aramaico: «Viva o rei para sempre! Conta o sonho aos teus servos e dar-te-emos a interpretação.»

2:5  *O rei disse aos caldeus: «É para mim coisa certa que, se não me apresentais o conteúdo do sonho, bem como a sua interpretação, sereis cortados em pedaços e vossas casas reduzidas a um montão de imundícies.

2:6  *Porém, se me revelardes não só o sonho mas também a sua interpretação, recebereis de mim dádivas, presentes e grandes provas de consideração. Dizei-me, pois, o sonho e o que significa.»

2:7  Responderam novamente: «Que o rei conte o sonho aos seus servos e revelaremos a sua interpretação.»

2:8  «Sei agora perfeitamente – replicou o rei – que procurais ganhar tempo, pois vedes que estou completamente decidido a aplicar-vos essa sentença,

2:9  se não me revelais o conteúdo do sonho. Combinastes para me mentir e me enganar, esperando que as circunstâncias mudem. Vamos, dizei-me o que eu sonhei e saberei se sois capazes de lhe dar a interpretação.»

2:10  Os caldeus responderam ao rei desta maneira: «Não há homem sobre a terra capaz de descobrir o segredo do rei. E, de facto, nenhum rei, governador ou homem poderoso exigiu semelhante coisa de um escriba, mago ou caldeu.

2:11  A questão posta pelo rei é difícil e ninguém poderá dar ao rei a solução, exceto os deuses, que não têm morada entre os mortais.»

2:12  Ao ouvir isto, o rei enfureceu-se e em sua cólera mandou exterminar todos os sábios da Babilónia.

2:13  A decisão foi publicada e o massacre dos sábios começou. Procuraram Daniel e os companheiros para os matar também.

2:14  Daniel, porém, dirigiu a Arioc – chefe dos guardas do rei – que se dispunha a matar todos os sábios babilónios, propostas cheias de prudência e sensatez.

2:15  Perguntou-lhe: «Qual a razão para uma sentença tão severa da parte do rei?» Arioc expôs-lhe o assunto.

2:16  Imediatamente Daniel foi ter com o rei para pedir que lhe concedesse o tempo necessário para dar ao rei a interpretação pedida.

2:17  Daniel entrou em sua casa e informou do facto os companheiros Hananias, Michael e Azarias.

2:18  Pediu-lhes que implorassem a misericórdia do Deus dos céus, a propósito deste enigma, a fim de que não fossem exterminados Daniel e os seus companheiros com os restantes sábios da Babilónia.

2:19  *O mistério foi, então, revelado a Daniel numa visão noturna. Daniel bendisse o Deus dos céus

2:20  e exprimiu-se deste modo: «Louvado seja o nome de Deus, bendito seja de eternidade em eternidade, porque a Ele pertencem a sabedoria e o poder.

2:21  *É Ele quem modifica os tempos e as circunstâncias; é Ele quem depõe os reis e os eleva; é Ele quem dá a sabedoria aos sábios e a ciência aos que têm inteligência;

2:22  *é Ele quem revela o que é profundo e escondido, quem conhece o que se esconde nas trevas, e a luz mora junto dele.

2:23  Ó Deus de meus pais, eu te celebro e te louvo, porque me deste a sabedoria e a coragem, porque me manifestaste o que te pedimos, ao resolver a dificuldade do rei.»

2:24  Depois, Daniel foi ter com Arioc, a quem o rei tinha encarregado de exterminar os sábios da Babilónia. Falou-lhe assim: «Não mandes matar os sábios da Babilónia. Leva-me até junto do rei, para que lhe dê a explicação.»

2:25  Apressou-se então Arioc a conduzir Daniel junto do rei, falando-lhe deste modo: «Encontrei, entre os deportados da Judeia, um homem que dará a conhecer ao rei a explicação que deseja.»

2:26  O rei tomou a palavra e disse a Daniel, que tinha o sobrenome de Beltechaçar: «Na verdade, tu és capaz de me dar a conhecer o sonho que tive e a sua interpretação?» Daniel respondeu-lhe:

2:27  «O mistério de que o rei pede esclarecimento, nem os sábios, nem os magos, nem os feiticeiros, nem os astrólogos são capazes de o revelar ao rei.

2:28  *Porém, nos céus há um Deus que desvenda os mistérios e Ele quis revelar ao rei Nabucodonosor o que vai acontecer na continuação dos tempos. Eis, pois, o teu sonho e as visões que se apresentaram ao teu espírito, no teu leito:

2:29  Ó rei, os pensamentos que te vieram ao espírito, enquanto estavas no teu leito, referiam-se ao que sucederá no futuro, e aquele que desvenda o que é secreto dá-te a conhecer o que deve advir.

2:30  Quanto a mim, se este mistério me foi revelado, não é por em mim haver mais sabedoria que nos outros homens, antes foi para dar ao rei a interpretação, a fim de que vejas claro os pensamentos do teu coração.

2:31  Ó rei, tu tiveste uma visão. Eis que uma grande, uma enorme estátua se levantava diante de ti; era de um brilho extraordinário, mas de um aspeto terrível.

2:32  Esta estátua tinha a cabeça de ouro fino, o peito e os braços de prata, o ventre e as ancas de bronze,

2:33  as pernas de ferro, os pés metade de ferro e metade de barro.

2:34  *Contemplavas tu esta estátua, quando uma pedra se desprendeu da montanha, sem intervenção de mão alguma, e veio bater nos seus pés, que eram de ferro e argila, e lhos esmigalhou.

2:35  Então, com a mesma pancada foram feitos em pedaços o ferro, o barro, o bronze, a prata, o ouro, e, semelhantes ao pó que no verão voa da eira, foram levados pelo vento sem que deixassem qualquer vestígio. A pedra que tinha embatido contra a estátua transformou-se numa alta montanha, que encheu toda a terra.

2:36  *Este era o sonho. Vamos agora dar ao rei a sua interpretação.

2:37  Tu, ó rei, és o rei dos reis, a quem o Deus dos céus deu a realeza, o poder, a força e a glória;

2:38  a quem entregou o domínio sobre os homens, onde quer que eles habitem, sobre os animais terrestres e sobre as aves do céu. Tu é que és a cabeça de ouro.

2:39  Depois de ti surgirá um outro reino menor que o teu; depois um terceiro reino, o de bronze, que dominará sobre toda a terra.

2:40  Um quarto reino será forte como o ferro; assim como o ferro quebra e esmaga tudo, assim este esmagará e aniquilará todos os outros.

2:41  Os pés e os dedos que viste, em parte de argila de oleiro, em parte de ferro, indicam que este reino será dividido; haverá nele alguma coisa da resistência do ferro, conforme tu viste ferro misturado com argila.

2:42  Os dedos dos pés, em parte de ferro e em parte de barro, significam que o reino será ao mesmo tempo forte e frágil.

2:43  Se tu viste o ferro junto com o barro, foi porque as duas partes se uniram por descendência humana, mas não se aguentarão juntas, do mesmo modo que o ferro não se funde com a argila.

2:44  *No tempo destes reis, o Deus dos céus fará aparecer um reino que jamais será destruído e cuja soberania nunca passará para outro povo. Esmagará e aniquilará todos os outros, enquanto ele subsistirá para sempre.

2:45  Foi o que pudeste ver na pedra que se desprendia da montanha, sem intervenção de mão alguma, e que reduzia a migalhas o ferro, o bronze, a argila, a prata e o ouro. O grande Deus deu a conhecer ao rei o que acontecerá no futuro. O sonho é verdadeiro e a interpretação dele é digna de crédito.»

2:46  Então, o rei Nabucodonosor atirou-se de face por terra, prostrado diante de Daniel; em seguida, ordenou que lhe oferecessem oblações e incenso.

2:47  *Dirigindo-se a Daniel, o rei disse: «O vosso Deus é verdadeiramente o Deus dos deuses, o Senhor dos reis; é também Ele quem manifesta os mistérios, visto que só tu os pudeste revelar.»

2:48  O rei elevou Daniel em dignidade e deu-lhe numerosos e ricos presentes; constituiu-o governador de toda a província da Babilónia e nomeou-o chefe supremo de todos os sábios da Babilónia.

2:49  A pedido de Daniel, entregou a Chadrac, Mechac e Abed-Nego a administração da província da Babilónia, enquanto Daniel ficava na corte real.

Chapter 3

3:1  *O rei Nabucodonosor fez uma estátua de ouro, com a altura de sessenta côvados e com seis de largura, que levantou na planície de Dura, na província da Babilónia.

3:2  *E depois mandou convidar os sátrapas, os prefeitos, os governadores, os conselheiros, os tesoureiros, os legistas, os juízes e todas as autoridades das províncias, para vir à inauguração da estátua, que o rei Nabucodonosor tinha erigido.

3:3  Assim, pois, juntaram-se os sátrapas, os prefeitos, os governadores, conselheiros, tesoureiros, legistas, juízes e todas as autoridades das províncias, para a inauguração da estátua levantada pelo rei e, diante dela, todos permaneceram de pé.

3:4  *Por meio de um arauto foi feita, então, a proclamação seguinte: «Povos, nações, gente de todas as línguas, eis o que se traz ao vosso conhecimento:

3:5  *No momento em que ouvirdes o som da trombeta, da flauta, da cítara, da lira, da harpa, do saltério e de toda a qualidade de instrumentos de música, prostrar-vos-eis em adoração diante da estátua de ouro, que o rei Nabucodonosor levantou.

3:6  *Todo aquele que não se prostrar e não adorar será imediatamente lançado na fornalha incandescente.»

3:7  Logo que ouviram o som da trombeta, da flauta, da cítara, da lira, da harpa, e de toda a espécie de instrumentos de música, todos os povos, nações e populações de todas as línguas prostraram-se em adoração diante da estátua de ouro, erigida pelo rei Nabucodonosor.

3:8  *Neste mesmo instante, certos caldeus aproximaram-se e denunciaram os judeus.

3:9  Dirigindo-se ao rei Nabucodonosor disseram:

3:10  «Tu mesmo, ó rei, publicaste o decreto de que todo o homem que ouvisse o som da trombeta, da flauta, da cítara, da lira, da harpa, do saltério e de toda a espécie de instrumento musical teria de se prostrar em adoração diante da estátua de ouro,

3:11  e que qualquer um que a isso se negasse seria lançado na fornalha incandescente.

3:12  Pois bem, há aí alguns judeus a quem confiaste a administração da província da Babilónia, Chadrac, Mechac e Abed-Nego que não respeitaram o teu decreto. Não prestam culto aos teus deuses e não adoram a estátua que tu levantaste.»

3:13  Nabucodonosor, irritado e furioso, mandou comparecer Chadrac, Mechac e Abed-Nego, os quais foram imediatamente levados à presença do rei.

3:14  Disse-lhes Nabucodonosor: «Chadrac, Mechac e Abed-Nego, é verdade que rejeitais o culto aos meus deuses e a adoração à estátua de ouro erigida por mim?

3:15  Pois bem! Estais dispostos, no momento em que ouvirdes o som da trombeta, da flauta, da cítara, da lira, da harpa, do saltério e de qualquer outro instrumento musical, a prostrar-vos em adoração diante da estátua que eu fiz? Se não o fizerdes, sereis logo lançados dentro da fornalha ardente. E qual o deus que poderá libertar-vos da minha mão?»

3:16  Chadrac, Mechac e Abed-Nego responderam ao rei Nabucodonosor: «Não vale a pena responder-te a propósito disto.

3:17  *Se isso assim é, o Deus que nós servimos pode livrar-nos da fornalha incandescente, e até mesmo, ó rei, da tua mão.

3:18  E ainda que o não faça, fica sabendo, ó rei, que não prestamos culto aos teus deuses e que não adoramos a estátua de ouro que tu levantaste.»

3:19  Então explodiu a fúria de Nabucodonosor contra Chadrac, Mechac e Abed-Nego; a expressão do seu rosto mudou e levantou a voz para mandar que se aquecesse a fornalha sete vezes mais que de costume.

3:20  Em seguida, ordenou aos soldados mais vigorosos do seu exército que amarrassem Chadrac, Mechac e Abed-Nego, a fim de os lançar na fornalha incandescente.

3:21  Então, estes homens com as suas túnicas, com as suas roupas, mantos e demais vestuário, foram ligados e atirados à fornalha ardente.

3:22  Mas os homens que, por ordem premente do rei, tinham aquecido extraordinariamente a fornalha e para ali tinham atirado Chadrac, Mechac e Abed-Nego foram mortos pelas chamas,

3:23  ao mesmo tempo que eram precipitados na fornalha os três jovens ligados.

3:24  *Então, passeavam no meio das chamas, louvando a Deus e bendizendo o Senhor.

3:25  Azarias, de pé no meio das chamas, fez esta prece:

3:26  *«Bendito e louvado sejas, Senhor, Deus dos nossos pais! Que o teu nome seja glorificado pelos séculos!

3:27  És justo em toda a tua conduta para connosco; as tuas obras são retas, os teus caminhos retos e os teus juízos equitativos.

3:28  Fizeste um juízo equitativo em tudo o que nos infligiste e em tudo o que infligiste à cidade santa de nossos pais, Jerusalém; é por efeito dum juízo equitativo que nos infligiste tudo isto, por causa dos nossos pecados.

3:29  Pecámos, prevaricámos, afastámo-nos de ti; em tudo temos procedido mal; e não observámos os teus mandamentos.

3:30  *Não os temos posto em prática, não temos observado as leis que nos deste e que eram para nossa felicidade.

3:31  Em todos os males que mandaste sobre nós, em tudo o que nos infligiste, foi uma sentença justa que aplicaste.

3:32  Entregaste-nos nas mãos de injustos inimigos, de ímpios encarniçados, sem lei, e a um rei, o mais iníquo e perverso de toda a terra.

3:33  Agora não ousamos mais abrir a boca. Vergonha e infâmia acabrunham os teus servos e todos os que te adoram.

3:34  Pelo teu nome, não nos abandones para sempre, não anules a aliança.

3:35  *Não nos retires a tua misericórdia, em atenção a Abraão, teu amigo, a Isaac, teu servo,

3:36  aos quais prometeste multiplicar a sua descendência como as estrelas do céu, e como a areia das praias do mar.

3:37  Senhor, estamos reduzidos a nada diante das nações, estamos hoje humilhados em face de toda a terra, por causa dos nossos pecados.

3:38  Agora não há nem príncipe, nem profeta, nem chefe, nem holocausto, nem sacrifício, nem oblação, nem incenso, nem um local para te oferecer as primícias e encontrar misericórdia.

3:39  Que pela contrição de coração e humilhação de espírito, sejamos acolhidos, como se trouxéssemos holocaustos de carneiros e de touros e de milhares de cordeiros gordos.

3:40  Que este seja hoje diante de ti o nosso sacrifício; possa ele reconciliar-nos contigo, pois não têm que envergonhar-se aqueles que em ti confiam.

3:41  É de todo o coração que agora te seguimos, te veneramos e procuramos a tua face; não nos confundas.

3:42  Trata-nos com a tua doçura habitual e com todas as riquezas da tua misericórdia.

3:43  Livra-nos pelos teus prodígios e cobre de glória o teu nome, Senhor.

3:44  Que sejam confundidos os que maltratam os teus servos, que sintam vergonha, ao verem-se sem poder e aniquilados na sua força.

3:45  *Assim, saberão que Tu és o Senhor Deus único, glorioso em toda a superfície da terra!»

3:46  Entretanto, os servos do rei, que os tinham lançado na fornalha, não cessavam de a aquecer com nafta, estopa, pez e lenha seca.

3:47  As chamas, que então subiam a quarenta e nove côvados acima da fornalha,

3:48  desviando-se, queimaram os caldeus que se encontravam junto dela.

3:49  O anjo do Senhor, porém, tinha descido até Azarias e seus companheiros e afastava o fogo da fornalha.

3:50  Transformou o centro da fornalha num lugar onde soprava como que uma brisa matinal: o fogo nem sequer os tocou e não lhes causou qualquer mal nem a menor dor.

3:51  Os três jovens, então, não tiveram senão uma só voz para louvar, glorificar e bendizer a Deus, na fornalha, com este cântico:

3:52  *«Bendito sejas, Senhor, Deus de nossos pais: – digno de louvor e glória eternamente! Bendito seja o teu nome santo e glorioso: – digno de supremo louvor e exaltação eternamente!

3:53  Bendito sejas no templo da tua santa glória: – digno de supremo louvor e glória eternamente!

3:54  *Bendito sejas por penetrares os abismos, sentado sobre os querubins: – digno de supremo louvor e exaltação eternamente!

3:55  Bendito sejas no teu trono real: – digno de supremo louvor e exaltação eternamente!

3:56  Bendito sejas no firmamento dos céus: – digno de supremo louvor e glória eternamente!

3:57  *Obras do Senhor, bendizei todas o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:58  Céus, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:59  Anjos do Senhor, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:60  Águas que estais acima dos céus, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:61  Todos os poderes do universo, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:62  Sol e Lua, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:63  Estrelas dos céus, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:64  Chuva e orvalho, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:65  Todos os ventos, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:66  Fogo e chama, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:67  Frio e calor, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:68  Orvalho e geada, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:69  Frio e gelo, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:70  Gelos e neves, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:71  Noites e dias, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:72  Luz e trevas, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:73  Relâmpagos e nuvens, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:74  Que a terra bendiga o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:75  Montes e colinas, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:76  Tudo o que germina na terra, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:77  Mares e rios, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:78  Fontes, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:79  Monstros marinhos e tudo o que se move nas águas, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:80  Todas as aves do céu, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:81  Todos os animais, selvagens e domésticos, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:82  Vós, seres humanos, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:83  Que Israel bendiga o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:84  Sacerdotes, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:85  Servos do Senhor, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:86  Espíritos e almas dos justos, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:87  Santos e humildes de coração, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente!

3:88  Hananias, Azarias, Michael, bendizei o Senhor: – a Ele a glória e o louvor eternamente! Porque nos libertou da morada das sombras, nos salvou do poder da morte; tirou-nos da fornalha incandescente e arrancou-nos do meio das chamas.

3:89  Glorificai o Senhor, porque é bom, porque a sua misericórdia é eterna.

3:90  Vós, os piedosos, bendizei o Senhor, Deus dos deuses, louvai-o, glorificai-o, porque a sua misericórdia é eterna!»

3:91  (24) *Então o rei Nabucodonosor, estupefacto, levantou-se repentinamente, dizendo para os seus conselheiros: «Não foram três homens, atados de pés e mãos, que lançámos ao fogo?» Responderam eles ao rei: «Com certeza.»

3:92  (25) *«Pois bem –replicou o rei – vejo quatro homens soltos, que passeiam no meio do fogo, sem este lhes causar mal; o quarto tem o aspeto de um filho de Deus.»

3:93  (26) *Por isso, Nabucodonosor aproximou-se da abertura da fornalha e gritou: «Chadrac, Mechac, Abed-Nego, servos do Deus Altíssimo, saí e vinde!» Logo Chadrac, Mechac e Abed-Nego saíram do meio do fogo.

3:94  (27) *Os sátrapas, os prefeitos, os governadores e os conselheiros do rei, reunidos em volta, verificaram que o fogo não tinha tido qualquer efeito sobre o corpo daqueles homens, que nem um cabelo das suas cabeças tinha sido chamuscado, que as vestes deles estavam intactas e que nem mesmo traziam indício de cheiro a fogo.

3:95  (28) Nabucodonosor, tomando a palavra, disse: «Bendito seja o Deus de Chadrac, de Mechac e de Abed-Nego! Ele enviou o seu anjo para libertar os seus servos que, confiando nele, expuseram a vida, transgredindo as ordens do rei, antes que prostrarem-se em adoração diante de um outro deus que não fosse o Deus deles.

3:96  (29)Estabeleço, pois, esta ordem: ‘Em qualquer povo, nação ou língua, todo aquele que disser alguma coisa de mal contra o Deus de Chadrac, de Mechac e de Abed-Nego, será feito em pedaços e a sua casa reduzida a um montão de imundícies, porque não há outro Deus capaz de realizar uma tal libertação’.»

3:97  (30)Depois, o rei melhorou ainda a situação de Chadrac, de Mechac e de Abed-Nego, na província da Babilónia.

3:98  (31)«O rei Nabucodonosor a todos os povos, nações e gentes de todas as línguas que habitam a terra: paz e prosperidade!

3:99  (32) *Pareceu-me bom dar-vos a conhecer os milagres e prodígios que o Deus Altíssimo operou em meu favor.

3:100  (33) Oh! Como os seus milagres são grandes e os seus prodígios formidáveis! O reino dele é um reino eterno! O seu império vai de geração em geração.»

Chapter 4

4:1  *«Eu, Nabucodonosor, vivia tranquilo em minha casa e cheio de êxito no meu palácio.

4:2  Tive um sonho que me apavorou; na cama sofri horrores e as visões perturbaram-me.

4:3  Dei ordem para que fizessem vir à minha presença todos os sábios da Babilónia, a fim de me darem a interpretação do sonho.

4:4  Vieram, então, os escribas, os magos, os caldeus e os feiticeiros, a quem narrei este sonho, mas não me souberam indicar o seu sentido.

4:5  *Por último, apresentou-se diante de mim Daniel, apelidado Beltechaçar – conforme o nome do meu deus – e nele reside o espírito do Deus santo. Contei-lhe o sonho e disse-lhe:

4:6  “Beltechaçar, chefe dos magos, sei que reside em ti o espírito do Deus santo e que nenhum mistério te embaraça. Dá-me a interpretação do sonho que tive.”

4:7  *Foram assim, no meu leito, as visões do meu espírito: vi, no meio da terra, uma árvore muito alta.

4:8  *Esta árvore cresceu e tornou-se vigorosa. O cimo tocava no céu; avistava-se desde os confins de toda a terra.

4:9  *A sua folhagem era bela e os frutos abundantes; a todos forneciam alimentos. À sombra dela, abrigavam-se os animais do campo; nos ramos moravam as aves do céu, e toda a criatura tirava dela a sua subsistência.

4:10  *Nas visões do meu espírito, contemplei um Vigilante. Era como um santo que descia do céu

4:11  e se pôs a gritar com uma voz forte: “Derrubai a árvore, cortai-lhe os ramos; fazei-lhe cair as folhas e atirai para longe os seus frutos. Que os animais fujam de debaixo dela e que as aves deixem a sua ramagem.

4:12  *Contudo, deixai ficar na terra o tronco e suas raízes, mas ligados com cadeias de ferro e de bronze. Que o tronco seja molhado pelo orvalho do céu e que tenha o seu quinhão de erva com os animais da terra.

4:13  *Que se lhe mude o coração; que, em vez de um coração humano, lhe seja dado um coração de animal e que sete tempos passem por ele.

4:14  *Esta sentença é um decreto dos Vigilantes, esta resolução é uma ordem dos santos, a fim de que os vivos saibam que o Altíssimo domina sobre a realeza dos homens, e que Ele a dá a quem lhe apraz e a ela pode elevar o mais humilde dos mortais.”

4:15  *Tal foi o sonho que eu, rei Nabucodonosor, tive. Tu, Beltechaçar, dá-me a interpretação dele, porque nenhum dos sábios do meu reino é capaz de o fazer. Mas, quanto a ti, tu podes, porque em ti reside o espírito do Deus santo.»

4:16  Então Daniel, chamado Beltechaçar, ficou aterrorizado, por instantes, e perturbado com os seus pensamentos. O rei recomeçou: «Beltechaçar, que este sonho e o significado dele não te perturbem!» Beltechaçar respondeu: «Meu senhor, que o sonho seja para os teus inimigos e a sua interpretação para os teus adversários!

4:17  A árvore que viste crescer e adornar-se, cujo cimo tocava o céu e que se avistava do extremo da terra,

4:18  essa árvore de bela folhagem, de frutos abundantes, que a todos dava de comer, debaixo da qual se acolhiam os animais do campo e em cuja folhagem se abrigavam as aves do céu,

4:19  essa árvore és tu, ó rei, que te tornaste grande e poderoso, crescendo sempre até atingires os astros e exercendo o teu império até aos extremos da terra.

4:20  *E o rei viu descer do céu o santo Vigilante que gritava: ‘Abatei a árvore, cortai-lhe os ramos, mas deixai na terra o tronco das suas raízes, ainda que ligado com cadeias de ferro e de bronze, no meio da erva dos campos; que seja molhado pelo orvalho do céu e que viva com os animais do campo até que sobre ele tenham passado sete tempos’.

4:21  Eis o que significa: trata-se, ó rei, de um decreto do Altíssimo que vai atingir o rei, meu senhor:

4:22  Expulsar-te-ão de entre os homens e far-te-ão habitar com os animais dos campos; pastarás erva como os bois e serás molhado pelo orvalho do céu. Sete tempos passarão sobre ti, até que reconheças que o Altíssimo domina sobre a realeza dos homens e que Ele a dá a quem lhe apraz.

4:23  *Se se ordenou deixar intacto o tronco das raízes da árvore, é que a realeza te será confirmada, desde que tenhas reconhecido a soberania do Céu.

4:24  Cuida, pois, ó rei, de aceitar o meu conselho: redime o teu pecado pela justiça, e as tuas iniquidades, pela piedade para com os infelizes; talvez isto consiga prolongar a tua prosperidade.»

4:25  Tudo isto aconteceu ao rei Nabucodonosor.

4:26  Doze meses mais tarde, o rei, quando passeava no palácio real da Babilónia,

4:27  *fazia esta reflexão: «Eis Babilónia-a-Grande, que eu edifiquei para residência real, pelo poder da minha força e para glória da minha majestade!»

4:28  Falava ainda, quando uma voz veio do Céu: «É-te anunciado, ó rei Nabucodonosor, que o reino te vai ser tirado.

4:29  Vão expulsar-te do meio dos homens, para te levarem a viver entre os animais dos campos; comerás erva como os bois. Sete tempos passarão sobre ti, até que reconheças que o Altíssimo domina sobre a realeza dos homens e que a dá a quem bem lhe apraz.»

4:30  No mesmo instante se cumpria o oráculo pronunciado sobre Nabucodonosor: foi afastado de entre os homens e pastava erva como os bois; o seu corpo foi ensopado pelo orvalho do céu, os cabelos cresceram-lhe como as plumas à águia, e as unhas como as unhas das aves.

4:31  «Ao fim dos dias marcados, eu, Nabucodonosor, levantei os olhos ao céu. A faculdade da razão voltou-me e bendisse o Altíssimo; louvava e glorificava aquele que vive eternamente, cujo domínio é eterno e cujo reino perdura, de geração em geração.

4:32  Diante dele nenhum habitante da terra conta; age conforme lhe apraz, tanto para a milícia celeste como para os habitantes da terra. Ninguém pode agarrar-lhe a mão e dizer-lhe: ‘Que fazes?’

4:33  Naquela mesma altura, a razão foi-me restituída e, com a glória da minha realeza, também a minha majestade e esplendor. Os meus conselheiros e os meus grandes vieram procurar-me; fui estabelecido na chefia do reino e o meu poder cresceu extraordinariamente.

4:34  *Eu, Nabucodonosor, agora louvo, exalto e glorifico o rei dos céus, cujas obras são todas justas e cujos caminhos são retos e que tem poder para humilhar os orgulhosos.»

Chapter 5

5:1  *O rei Baltasar deu um banquete a mil dos seus conselheiros; e, na presença de todos eles, foi bebendo vinho.

5:2  *Excitado pela bebida, mandou trazer os vasos de ouro e prata que o pai Nabucodonosor tinha tirado do templo de Jerusalém, a fim de que o rei, os seus grandes, as concubinas e as bailarinas, se servissem deles para beber.

5:3  Trouxeram, pois, os vasos de ouro que tinham sido roubados ao templo de Deus em Jerusalém. O rei, os seus conselheiros, as concubinas e as bailarinas beberam por eles.

5:4  Depois de terem bebido o vinho, iniciaram o louvor aos deuses de ouro, de prata, de bronze, de ferro, de madeira e de pedra.

5:5  Neste momento, apareceram dedos de mão humana que escreviam defronte do candelabro, sobre o reboco da parede do palácio real. O rei, à vista da mão que escrevia,

5:6  mudou de cor, pensamentos terríveis o assaltaram, os músculos dos rins perderam o vigor e os joelhos entrechocavam-se.

5:7  O rei gritou que mandassem vir os feiticeiros, os caldeus e os astrólogos. E disse aos sábios da Babilónia: «Aquele que decifrar esta inscrição e me der o sentido da mesma será revestido de púrpura, levará ao pescoço um colar de ouro e tomará o terceiro lugar no governo do reino.»

5:8  *Entraram na sala todos os sábios do rei mas foram incapazes de ler aquela inscrição e de dar ao rei o sentido dela.

5:9  Baltasar ficou muito aterrado, a sua face mudou de cor e os seus conselheiros estavam consternados.

5:10  A rainha, porém, tendo conhecimento das palavras do rei e dos conselheiros, entrou na sala do banquete, tomou a palavra e disse: «Ó rei, viva o rei para sempre! Que os teus pensamentos não te aterrem e não mudes assim de cor.

5:11  *Há no teu reino um homem em quem reside o espírito do Deus santo. Em vida de teu pai, havia nele uma luz, uma inteligência e uma sabedoria semelhantes à sabedoria dos deuses. Por isso, o rei Nabucodonosor, teu pai, o constituíra chefe dos escribas, dos magos, dos caldeus e dos astrólogos.

5:12  Já que um espírito superior, uma ciência e uma inteligência para interpretar os sonhos, para explicar os enigmas e resolver as dificuldades, se encontram em Daniel – a quem o rei deu o nome de Beltechaçar – manda-o chamar, pois Daniel decifrará o sentido dessa inscrição.»

5:13  Daniel foi, então, levado à presença do rei, que lhe disse: «És tu, de facto, Daniel, deportado de Judá, a quem meu pai trouxe da Judeia para aqui?

5:14  Ouvi dizer a teu respeito que o espírito de Deus está em ti e que em ti se encontram uma luz, uma inteligência e uma sabedoria superiores.

5:15  Acabam de se apresentar diante de mim os sábios e os feiticeiros para lerem esta inscrição e dar-me a conhecer o seu sentido. Mas não puderam dar-me o significado destas palavras.

5:16  Ora, asseguraram-me que tu és mestre na arte das interpretações e das resoluções de enigmas. Se tu, pois, conseguires ler o que está escrito e me deres a conhecer a sua interpretação, serás revestido de púrpura, trarás ao pescoço um colar de ouro e receberás o terceiro lugar no governo do reino.»

5:17  Daniel respondeu deste modo ao rei: «Guardai as vossas dádivas; as vossas honrarias, dai-as a outro! Contudo, eu lerei ao rei o texto e dar-lhe-ei o significado dele.

5:18  Ó rei, o Deus Altíssimo tinha dado a Nabucodonosor, teu pai, a realeza e a grandeza, a glória e a majestade.

5:19  *Em razão desta grandeza que lhe tinha conferido, todos os povos, todas as nações e gentes de todas as línguas tremiam de medo diante dele. Matava a quem queria, como deixava com vida aquele que queria; exaltava ou humilhava quem ele desejava.

5:20  Mas, tendo-se envaidecido o seu coração e tendo-se endurecido o seu espírito até à presunção, foi deposto do trono real e despojado da glória.

5:21  Foi expulso de entre os seres humanos e, tornando-se o coração dele semelhante ao das bestas, ficou na companhia dos burros selvagens, apascentando-se de erva como os bois; e o seu corpo foi ensopado pelo orvalho do céu, até que reconheceu que o Deus Altíssimo domina sobre a realeza dos homens e a ela eleva quem bem lhe apraz.

5:22  Tu, Baltasar, filho dele, embora conhecendo tudo isto, não humilhaste o teu coração.

5:23  *Mas levantaste-te contra o Senhor do Céu; trouxeram-te os vasos do seu templo, pelos quais bebeste vinho, tu, os teus grandes, as tuas mulheres e concubinas. Tributaste louvores aos deuses de prata, de ouro, de bronze, de ferro, de madeira e de pedra, que são cegos, surdos e nada conhecem, em vez de glorificares o Deus que tem na mão o teu sopro de vida e que conhece todos os teus passos.

5:24  Por isso, foi enviada de sua parte esta mão, que traçou na parede estas palavras.

5:25  *Eis o texto aqui escrito: ‘Mené, Tequel e Parsin.’

5:26  Eis o sentido destas palavras: Mené: Deus mediu o teu reino e pôs-lhe um termo;

5:27  Tequel: foste pesado na balança e encontrado muito leve;

5:28  Parsin: o teu reino foi dividido e entregue aos medos e aos persas.»

5:29  Então, por ordem de Baltasar, Daniel foi revestido de púrpura, puseram-lhe ao pescoço um colar de ouro e publicou-se que teria o terceiro lugar na governação do reino.

5:30  Na mesma noite, foi morto Baltasar, rei dos caldeus.

Chapter 6

6:1  *Dario, rei dos Medos, recebeu o reino com a idade de cerca de sessenta e dois anos.

6:2  *Dario, o Medo, houve por bem nomear e distribuir por todo o reino cento e vinte sátrapas,

6:3  submetidos a três ministros, um dos quais era Daniel; a estes tinham eles de prestar contas, a fim de que os interesses do rei não fossem lesados.

6:4  Ora Daniel, em virtude da superioridade do seu espírito, distinguia-se dos ministros e sátrapas e o rei pensava colocá-lo à frente de todo o reino.

6:5  Por isso, os ministros e os sátrapas procuraram o meio de acusar Daniel, em questões de interesse real. Mas não puderam descobrir qualquer pretexto ou falta, porque era íntegro e nada se encontrava contra ele de errado ou repreensível.

6:6  Disseram, pois, esses homens: «Não encontraremos motivo algum de acusação contra este Daniel, a não ser no que diz respeito à lei do seu Deus.»

6:7  Então ministros e sátrapas, em tumulto, foram ter com o rei e disseram-lhe: «Rei Dario, viva o rei para sempre!

6:8  Os ministros do reino, os prefeitos, os sátrapas, os conselheiros e os governadores estão todos de acordo que seja publicado um edito real para ordenar esta proibição: ‘Todo aquele que, no prazo de trinta dias, dirigir súplicas a qualquer deus ou homem que não sejas tu, ó rei, será lançado na cova dos leões.’

6:9  *Promulga, pois, ó rei, esta proibição e manda fazer dela um documento, a fim de que não possa ser anulada, conforme a lei dos Medos e dos Persas, que é irrevogável.»

6:10  Então, o rei Dario fez redigir o documento com a proibição.

6:11  *Ao saber deste documento, Daniel entrou em sua casa, a qual tinha, no primeiro andar, janelas que abriam para o lado de Jerusalém. Como até aí, continuou a rezar e a louvar a Deus, de joelhos, três vezes ao dia.

6:12  Nessa altura, aqueles homens acorreram, alvoroçados, e encontraram Daniel em oração, invocando o seu Deus.

6:13  Dirigiram-se imediatamente a casa do rei e disseram-lhe, a propósito do decreto real de proibição: «Não promulgaste tu, ó rei, uma proibição, declarando que quem, no período de trinta dias, invocasse algum deus ou homem que não fosses tu, seria lançado na cova dos leões?» Respondeu o rei: «Com certeza, conforme a lei dos Medos e dos Persas, que não pode ser modificada.»

6:14  «Pois bem – prosseguiram eles – Daniel, o exilado de Judá, não teve consideração nem pela tua pessoa, nem pelo decreto que promulgaste. Três vezes ao dia, faz a sua oração.»

6:15  Ao ouvir estas palavras, o rei, muito pesaroso, tomou a peito, apesar de tudo, a salvação de Daniel e nisso se aplicou até ao pôr do sol.

6:16  Porém, os mesmos homens, em tumulto, vieram novamente procurar o rei. «Sabei, ó rei – disseram-lhe – que a lei dos Medos e dos Persas não permite qualquer revogação de uma proibição ou de um decreto publicado pelo rei.»

6:17  O rei, então, mandou levar Daniel e lançá-lo na cova dos leões. Disse-lhe o rei: «O Deus que tu adoras com tamanha fidelidade, Ele próprio te libertará!»

6:18  Trouxeram uma pedra, que rolaram sobre a abertura da cova: o rei selou-a com o seu sinete e com o sinete dos grandes, para que nada fosse modificado em atenção a Daniel.

6:19  Entrando no palácio, o rei passou a noite sem comer nada e sem mandar ir para junto dele concubina alguma; não conseguiu fechar os olhos.

6:20  De madrugada, levantou-se e partiu a toda a pressa para a cova dos leões.

6:21  Quando estava próximo, com uma voz muito magoada, chamou Daniel: «Daniel, servo do Deus vivo, o teu Deus, que adoras com tanta fidelidade, teria podido libertar-te dos leões?»

6:22  Daniel dirigiu-se ao rei nestes termos: «Ó rei, viva o rei para sempre!

6:23  *O meu Deus enviou o seu anjo e fechou as fauces dos leões, que não me fizeram qualquer mal, porque, aos olhos dele, estava inocente. Para contigo, ó rei, tão-pouco cometi qualquer falta.»

6:24  O rei, então, cheio de alegria, ordenou que tirassem Daniel da cova. Daniel foi, pois, tirado sem qualquer vestígio de ferimento, porque tinha fé no seu Deus.

6:25  *Por ordem do rei, trouxeram os acusadores de Daniel e atiraram-nos à cova dos leões, a eles, às mulheres e aos filhos. Ainda não tinham tocado o fundo da cova e já os leões os tinham agarrado e lhes tinham triturado os ossos.

6:26  *Então, o rei Dario escreveu: «A todos os povos, a todas as nações e à gente de todas as línguas que habitam a face da terra, paz e prosperidade!

6:27  Promulgo este decreto: ‘Que em toda a extensão do meu reino se tema e trema diante do Deus de Daniel, porque Ele é o Deus vivo, que subsiste eternamente; o seu reino jamais será destruído e o seu domínio é perpétuo.

6:28  Ele salva e Ele liberta, faz milagres e prodígios no céu e na terra: foi Ele quem livrou Daniel das garras dos leões.’»

6:29  *Foi assim que Daniel prosperou durante o reinado de Dario e durante o reinado de Ciro, o Persa.

Chapter 7

7:1  *No primeiro ano do reinado de Baltasar, rei da Babilónia, estando Daniel na cama, teve um sonho e visões. Consignou por escrito este sonho e o essencial dos factos.

7:2  *Assim se exprimiu Daniel: «Na minha visão noturna, eu via os quatro ventos do céu precipitarem-se sobre o grande mar.

7:3  *Surgiram do mar quatro grandes animais, diferentes uns dos outros.

7:4  *O primeiro era semelhante a um leão, mas tinha asas de águia. Enquanto o contemplava, foram-lhe arrancadas as asas. Levantavam-no da terra e endireitavam-no sobre os pés como um homem. Depois, deram-lhe um coração de homem.

7:5  *Em seguida, apareceu um segundo animal semelhante a um urso; erguia-se sobre um dos lados e segurava na goela, entre os dentes, três costelas. Diziam-lhe: ‘Vamos! Devora muita carne!’

7:6  *Depois disto, vi um terceiro animal parecido com uma pantera, que tinha sobre o dorso quatro asas de ave e também quatro cabeças. Foi-lhe entregue a soberania.

7:7  *Enfim, quando contemplava estas visões noturnas, divisei um quarto animal, horroroso, aterrador e de uma força excecional. Tinha enormes dentes de ferro; devorava, depois fazia em pedaços e o resto calcava-o aos pés. Era diferente dos animais anteriores, pois tinha dez chifres.

7:8  *Quando eu contemplava os chifres, eis que surgiu do meio deles um outro chifre mais pequeno. Para dar lugar a este chifre, três dos primeiros foram arrancados. Este chifre tinha olhos como um homem e uma boca que proferia palavras arrogantes.»

7:9  *«Continuava eu a olhar, até que foram preparados uns tronos, e um Ancião sentou-se. Branco como a neve era o seu vestuário, e os cabelos da cabeça eram como de lã pura; o trono era feito de chamas, com rodas de fogo flamejante.

7:10  *Corria um rio de fogo que jorrava da parte da frente dele. Mil milhares o serviam, dez mil miríades lhe assistiam. O tribunal reuniu-se em sessão e foram abertos os livros.

7:11  *Eu olhava. Por causa do ruído das palavras arrogantes que o chifre proferia, esse animal foi morto e o seu corpo desfeito e atirado às chamas do fogo.

7:12  Quanto aos outros animais, também lhes foi tirado o poderio; no entanto, a duração da sua vida foi-lhes fixada a um tempo e uma data.

7:13  *Contemplando sempre a visão noturna, vi aproximar-se, sobre as nuvens do céu, um ser semelhante a um filho de homem. Avançou até ao Ancião, diante do qual o conduziram.

7:14  *Foram-lhe dadas as soberanias, a glória e a realeza. Todos os povos, todas as nações e as gentes de todas as línguas o serviram. O seu império é um império eterno que não passará jamais, e o seu reino nunca será destruído.»

7:15  Perante semelhantes visões, eu, Daniel, senti-me esmagado, com o espírito perturbado.

7:16  Aproximei-me de um dos assistentes e interroguei-o sobre a realidade de tudo aquilo. Respondeu-me e deu-me a explicação:

7:17  «Estes portentosos animais, que são em número de quatro, são quatro reis que se levantarão da terra.

7:18  *Os santos do Altíssimo são os que hão de receber a realeza e guardá-la por toda a eternidade.»

7:19  Quis, então, conhecer exatamente o que se referia ao quarto animal, diferente dos outros, excessivamente aterrador, cujos dentes eram de ferro e as garras de bronze, que devorava, depois desfazia em pedaços e o que restava calcava-o aos pés.

7:20  Desejei ser esclarecido acerca dos dez chifres que tinha na cabeça, bem como daquele outro chifre que tinha despontado e diante do qual três chifres tinham caído. É que esse chifre tinha olhos e uma boca que proferia palavras arrogantes e parecia maior que os seus companheiros.

7:21  Tinha visto este chifre fazer guerra aos santos e levar vantagem sobre eles.

7:22  Mas o Ancião, quando veio, fez justiça aos santos do Altíssimo. A hora deles era aquela e obtiveram a posse do reino.

7:23  *Respondeu-me assim: «O quarto animal será um quarto reino terrestre, que será diferente de todos os reinos, devorará o mundo, o calcará e o reduzirá a pó.

7:24  Os dez chifres designam dez reis, que surgirão neste reino, mas após estes surgirá um outro, diferente dos anteriores, o qual vencerá três reis.

7:25  *Proferirá insultos contra o Altíssimo, perseguirá os santos do Altíssimo. Pensará em mudar os tempos sagrados e a religião. Os santos viverão sob a sua alçada, apenas durante um determinado espaço de tempo.

7:26  Mas o julgamento continuará e tirar-lhe-ão o domínio, para o suprimir e aniquilar definitivamente.

7:27  A realeza, o império e a grandeza de todos os reinos, situados sob os céus, serão então devolvidos ao povo dos santos do Altíssimo. O seu reino é eterno e todas as soberanias o temerão e lhe prestarão obediência.»

7:28  Aqui findou o relato. Quanto a mim, Daniel, os meus pensamentos perturbaram-me a tal ponto que mudei de cor. Todavia, conservava tudo isto no meu coração.

Chapter 8

8:1  *No terceiro ano do reinado de Baltasar, eu, Daniel, tive uma visão, depois daquela que tinha tido anteriormente.

8:2  *Nesta visão, encontrava-me na fortaleza de Susa, que defende a província de Elam. Sempre em estado de visão, encontrei-me junto do rio Ulai.

8:3  *Levantando os olhos, eis que vi um carneiro que estava em frente do rio. Tinha dois chifres, dois altos chifres, mas um deles era mais alto que o outro. Este chifre mais alto surgiu depois.

8:4  Vi o carneiro acometer com os chifres na direção do ocidente, do norte e do sul. Nenhum animal se mantinha diante dele e ninguém era capaz de se libertar do seu poder. Fazia o que queria e aumentava o seu poder.

8:5  *Enquanto eu pensava atentamente, eis que um bode novo veio do ocidente e percorreu a terra toda sem tocar no chão; tinha entre os dois olhos um chifre muito saliente.

8:6  Chegou até junto do carneiro de duas hastes, que eu tinha visto deter-se em frente do rio, e correu contra ele num acesso de furor.

8:7  Vi-o aproximar-se do carneiro. Cheio de fúria e raiva contra ele, agrediu-o, partiu-lhe os dois chifres, sem que o carneiro tivesse tido a força de lhe resistir. O bode lançou por terra o carneiro e calcou-o com as patas e ninguém interveio para livrar o carneiro do ataque do seu adversário.

8:8  *Então, o bode cresceu extraordinariamente. Mas quando se tornou forte, o chifre grande partiu-se e foi substituído por quatro outros chifres, alongados na direção dos quatro ventos do céu.

8:9  *De um destes chifres, aliás o mais pequeno, saiu um outro chifre, que se desenvolveu consideravelmente na direção do sul, na direção do oriente e na direção da nação gloriosa.

8:10  *Cresceu até atingir o exército dos céus, do qual fez cair para a terra muitas estrelas e calcou-as com as patas.

8:11  Levantou-se mesmo contra o chefe deste exército, cujo sacrifício perpétuo aboliu e arrasou o santuário e o exército de Deus.

8:12  Em vez do altar dos sacrifícios, introduziu a iniquidade e atirou por terra a verdade. O chifre pequeno teve bom êxito na sua empresa.

8:13  *Vi um santo que falava, a quem um outro santo perguntou: «Quanto tempo durará o que anuncia a visão, a propósito do holocausto perpétuo, da abominação devastadora, do abandono do santuário e do exército dos fiéis calcado aos pés?»

8:14  *Aquele respondeu: «Duas mil e trezentas tardes e manhãs. Depois disso, o santuário será restaurado.»

8:15  Ora, enquanto eu contemplava esta visão e procurava compreendê-la, notei que estava de pé, diante de mim, um ser de forma humana.

8:16  *Ouvi uma voz de homem que vinha do meio do rio Ulai: «Gabriel – gritava ela – explica-lhe a visão.»

8:17  *Dirigiu-se, nesse momento, para o lugar onde eu me encontrava. Ao aproximar-se, fui acometido de terror e caí de face por terra. Gabriel disse-me: «Filho de homem, fica sabendo que esta visão se refere ao tempo final.»

8:18  Enquanto me falava, desfalecia eu, de rosto por terra. Mas ele tocou-me e pôs-me de pé, aí onde me encontrava.

8:19  *E disse-me: «Eis que vou manifestar-te o que advirá nos últimos tempos da ira, porque o fim tem a sua hora.

8:20  O carneiro de dois chifres que viste representa os reis da Média e da Pérsia.

8:21  *O bode peludo é o rei de Javan; o chifre grande que ele tem entre os olhos é o primeiro rei.

8:22  A sua fratura e o nascimento dos quatro chifres em lugar dele significam quatro reinos que saem desta nação, mas que não têm a sua força.

8:23  *No fim do seu império, quando os infiéis tiverem enchido a medida, surgirá um rei de modos duros e jeito astucioso.

8:24  O seu poder crescerá, mas não por ele mesmo. Causará extraordinárias devastações, será bem sucedido em suas empresas, exterminará os poderosos e o povo dos santos.

8:25  *Graças à sua habilidade, fará triunfar a perfídia. O seu coração inchará de orgulho e levará à morte muita gente à traição. Levantar-se-á contra o príncipe dos príncipes, mas será esmagado sem intervenção de mão humana.

8:26  *A visão que te foi mostrada, a respeito das tardes e das manhãs, é perfeitamente verdadeira. Porém, tu guarda em segredo esta visão, porque se refere a dias longínquos.»

8:27  Então, eu, Daniel, desfaleci. Fiquei doente durante muitos dias. Depois disto, tornei a entregar-me ao trabalho do serviço do rei. Fiquei estupefacto com a visão que tive e que ninguém conseguia compreender.

Chapter 9

9:1  *No primeiro ano de Dario, filho de Artaxerxes, da descendência dos Medos, que tinha sido instalado no trono do império dos caldeus,

9:2  *no primeiro ano do seu reinado, eu, Daniel, perscrutava as Escrituras sobre o número de anos que, segundo a palavra do Senhor dirigida ao profeta Jeremias, deviam medir o tempo em que Jerusalém estaria em ruínas. Era de setenta anos.

9:3  Voltei-me para o Senhor Deus, a fim de lhe dirigir uma súplica, jejuando e cobrindo-me de saco e cinza.

9:4  *Supliquei ao Senhor, meu Deus, e fiz-lhe a minha confissão nestes termos: «Ah! Senhor, Deus grande e temível, que és fiel à Aliança e que manténs o teu favor para com os que te amam e guardam os teus mandamentos.

9:5  *Todos nós pecámos, prevaricámos, praticámos a iniquidade, fomos revoltosos, afastámo-nos dos teus mandamentos e das tuas leis.

9:6  *Não escutámos os teus servos, os profetas, que falaram em teu nome aos nossos reis, aos nossos chefes, aos nossos pais e a todo o povo da nação.

9:7  *Para ti, Senhor, a justiça; para nós, a infâmia, como é hoje para as gentes de Judá, para os habitantes de Jerusalém e para todo o Israel, para aqueles que estão perto e aqueles que estão longe, em todos os países por onde os espalhaste, em consequência das iniquidades que cometeram contra ti.

9:8  Sim, ó Senhor, para nós a vergonha, para os nossos reis, para os nossos chefes, para os nossos pais, porque pecámos contra ti.

9:9  No Senhor, nosso Deus, há misericórdia e perdão, pois nos revoltámos contra Ele.

9:10  Recusámos escutar a voz do Senhor, nosso Deus; não seguimos as leis que nos propunha pela boca dos seus servos, os profetas.

9:11  *Todo o Israel transgrediu a tua Lei e voltou-se para o outro lado, a fim de não ouvir a tua voz. Por isso, a maldição e a imprecação que constam da Lei de Moisés, servo de Deus, foram espalhadas sobre nós, visto que pecámos contra Ele.

9:12  Executou as ameaças proferidas contra nós e contra os nossos governantes: atirou sobre nós calamidades tais, que nunca sob o céu houve uma, comparada àquela que fulminou Jerusalém.

9:13  Foi de harmonia com o que está escrito na Lei de Moisés que nos advieram estas calamidades. E não procurámos apaziguar o Senhor, nosso Deus, renunciando às iniquidades e dirigindo a atenção para a sua verdade.

9:14  *Por isso, o Senhor cuidou da desventura para a fazer cair sobre nós, pois que o Senhor, nosso Deus, é justo em tudo o que faz. Porém, não escutámos a sua voz.

9:15  *Agora, Senhor, nosso Deus, que fizeste sair o teu povo do Egito, por tua mão poderosa, e criaste uma glória que persiste ainda hoje, pecámos e praticámos o mal.

9:16  *Senhor, pela tua misericórdia, digna-te afastar a tua cólera e o teu furor da tua montanha santa, Jerusalém, pois é por causa dos nossos crimes e dos pecados de nossos pais que Jerusalém e o teu povo estão expostos aos insultos de todos os que nos cercam.

9:17  Escuta, pois, ó nosso Deus, a súplica insistente do teu servo. Pelo teu amor, Senhor, faz brilhar a tua face sobre o teu santuário devastado.

9:18  *Ó meu Deus, presta atenção e ouve-nos; abre os olhos para ver as nossas ruínas e a cidade que tem um nome que vem de ti. Não é por causa dos nossos atos de justiça que depomos a teus pés as nossas súplicas, mas em nome da tua grande misericórdia.

9:19  Senhor, ouve! Senhor, perdoa! Senhor, presta atenção! Atua! Pelo teu bom nome, ó meu Deus, não tardes, porque foi o teu nome que foi dado à tua cidade e ao teu povo.»

9:20  Falava eu ainda, a pedir, a confessar o meu pecado e o do meu povo Israel, a depor aos pés do Senhor, meu Deus, a minha súplica em favor da sua montanha santa;

9:21  *não tinha terminado esta oração, quando se aproximou de mim, em voo rápido, Gabriel, o ser que tinha presenciado anteriormente em visão; era a hora da oblação da tarde.

9:22  Para me informar, deu-me as seguintes explicações: «Daniel, vim neste momento aqui, para te esclarecer.

9:23  *Logo que tinhas começado a tua oração, uma palavra foi pronunciada e eu vim dar-ta a conhecer, porque és um homem de predileção. Presta, pois, atenção a este oráculo e procura compreender bem a visão:

9:24  *Setenta semanas foram fixadas ao teu povo e à tua cidade santa para conclusão da infidelidade, para cancelar os pecados e expiar a iniquidade, para instaurar uma justiça eterna, para selar a visão e a profecia e para ungir o Santo dos Santos.

9:25  *Sabe pois e compreende isto: após a declaração do decreto sobre a restauração de Jerusalém até a um chefe ungido, haverá sete semanas. Depois, durante sessenta e duas semanas, Jerusalém reaparecerá e será reedificada a praça e o muro. Mas tudo isto será feito entre angústias e dificuldades.

9:26  *Após estas sessenta e duas semanas, um ungido será exterminado e ninguém lhe sucederá. A cidade e o santuário serão destruídos por um chefe invasor; ela acabará devastada e até ao fim haverá guerra e devastação decretada.

9:27  *Ele concluirá uma sólida aliança com um grande número, por uma semana; ao meio da semana fará cessar o sacrifício e a oblação e, sobre o pináculo do templo, estará a abominação devastadora, e isto até que a destruição decretada se estenda sobre o devastador.»

Chapter 10

10:1  No terceiro ano de Ciro, rei da Pérsia, um oráculo foi revelado a Daniel, cognominado Beltechaçar. Este oráculo era verídico e anunciava grandes lutas. Daniel entendeu o oráculo e teve a compreensão da visão.

10:2  *Naqueles dias, eu, Daniel, fazia penitência durante três semanas.

10:3  Não tomei qualquer alimento delicado, não entrou em minha boca nem carne nem vinho; não me ungi com azeite, enquanto decorreram estas três semanas.

10:4  No vigésimo quarto dia do primeiro mês, encontrava-me eu na margem do grande rio Tigre.

10:5  *Levantando os olhos, vi um homem vestido de linho. Tinha sobre os rins uma cinta de ouro de Ufaz.

10:6  O corpo era como que de crisólito; a face brilhava como o relâmpago, os olhos como fachos ardentes, os braços e os pés tinham o aspeto do bronze polido e a sua voz ressoava como o rumor de uma multidão.

10:7  Só eu, Daniel, é que pude contemplar esta aparição; aqueles que estavam comigo não a viram, mas apoderou-se deles um tão grande pavor que correram a esconder-se.

10:8  Então, fiquei sozinho, continuando a presenciar esta portentosa aparição. Faltaram-me as forças; tornou-se lívida a cor do meu rosto e desfaleci.

10:9  Ouvi falar este homem e, ao som das suas palavras, caí desmaiado, com a face por terra.

10:10  Mas eis que uma mão me tocou e me sacudiu, colocando-me sobre os joelhos e as palmas das mãos.

10:11  *Disse-me ele: «Daniel, homem de predileção, atende às palavras que te vou dirigir. Levanta-te, pois tenho uma mensagem a comunicar-te.» Quando me falou assim, pus-me de pé, todo a tremer.

10:12  *Disse-me: «Não tenhas medo, Daniel, porque, desde o primeiro dia em que te aplicaste a compreender e te humilhaste diante do teu Deus, a tua oração foi atendida e é por causa de ti que eu aqui venho.

10:13  O príncipe do reino da Pérsia resistiu-me durante vinte e um dias; mas Miguel, um dos primeiros príncipes, veio em meu socorro. Deixei-o a bater-se com os reis da Pérsia,

10:14  e aqui estou para te fazer compreender o que deve acontecer ao teu povo nos últimos dias. Esta visão diz respeito ainda aos tempos longínquos.»

10:15  Enquanto ele me dirigia estas palavras, eu tinha o meu olhar fixo na terra e continuava mudo.

10:16  *De repente, alguém com forma de homem tocou-me nos lábios. Abri a boca para falar e disse àquele que se encontrava junto de mim: «Meu senhor, esta visão abalou-me e não tenho forças nenhumas.

10:17  Como é que o servo do meu senhor poderá conversar com o seu mestre, se estou no fim das forças e sem fôlego?»

10:18  Então, o ser com forma de homem tocou-me novamente e deu-me vigor.

10:19  Disse-me: «Não receies, homem de predileção! Que a paz seja contigo! Coragem! Coragem!» Enquanto me falava, senti-me reanimado. «Que fale o meu senhor – disse eu – já que tu me deste forças.»

10:20  Replicou-me: «Sabes porque te vim procurar? Eu devo regressar à luta contra o príncipe da Pérsia. Quando acabar esta luta, surgirá o príncipe da Grécia.

10:21  *Mas vou dar-te a conhecer o que está escrito no livro da verdade. Ninguém me ajuda nestes trabalhos, a não ser Miguel, o vosso príncipe.»

Chapter 11

11:1  *«Desde o primeiro ano de Dario, rei dos Medos, eu estive presente para lhe dar força e apoio.

11:2  Neste momento, vou dar-te a conhecer a verdade: haverá na Pérsia ainda três reis. O quarto ultrapassará em riqueza todos os outros. Quando as riquezas dele o tiverem tornado poderoso, porá tudo em movimento contra o reino da Grécia.»

11:3  «Levantar-se-á, porém, um rei poderoso que dominará sobre um vasto império, fazendo tudo o que lhe aprouver.

11:4  *Logo que se tornar poderoso, o seu reino será desmembrado e repartido pelos quatro ventos do céu. Não passará aos descendentes dele e jamais terá o mesmo poderio; porque o reino será dividido e dado a outros e não aos seus descendentes.

11:5  *O rei do Sul tornar-se-á forte, mas um dos generais do seu exército há de tornar-se mais forte e o seu império será grande.

11:6  *Após alguns anos, aliar-se-ão, e a filha do rei do Sul irá ter com o rei do Norte, a fim de estabelecer um acordo. Esta, porém, não se manterá no trono nem a sua descendência. Será entregue à morte com os que a tiverem acompanhado, o seu filho e aquele que a engrandeceu a seu tempo.

11:7  *Um dos rebentos da mesma raiz se levantará em sua substituição; marchará com o seu exército, entrará nas fortalezas do reino do Norte, atacá-lo-á e o dominará.

11:8  Levará mesmo, como cativos, para o Egito, os seus deuses, bem como as imagens de fundição e os objetos preciosos de ouro e de prata. Depois, evitará atacar o rei do Norte, durante alguns anos.

11:9  Este marchará contra o reino do Sul, mas regressará ao seu país.

11:10  *Entretanto, os filhos do rei do Norte prepararão a guerra, reunindo uma grande multidão de tropas que, espalhando-se qual torrente, invadirão, reaparecerão e levarão as hostilidades até à fortaleza dele.

11:11  *Irritado, o rei do Sul sairá para atacar o rei do Norte. Como ele, porá em pé de guerra um numeroso exército, e as tropas inimigas lhe serão entregues.

11:12  Após o aniquilamento destas tropas, inchará de orgulho. Matará dezenas de milhares de homens, sem que com isso se torne mais forte.

11:13  *O rei do Norte convocará novamente um exército, mais numeroso ainda que o primeiro e, alguns anos depois, avançará no meio de extensas tropas e de uma grande comitiva.

11:14  Por esta ocasião, muitos povos se levantarão contra o rei do Sul e homens impetuosos hão de surgir do meio do teu povo, para cumprir a visão, mas serão mal sucedidos.

11:15  *Virá então o rei do Norte, levantará trincheiras e apoderar-se-á de cidades bem fortificadas. Nem os exércitos do rei do Sul, nem mesmo as suas hostes escolhidas, o deterão; não haverá força que lhe resista.

11:16  *O invasor procederá conforme quiser, sem que alguém lhe possa fazer frente. Instalar-se-á no país que é a nação gloriosa e a destruirá com o seu poder.

11:17  *Empreenderá a conquista do reino do Sul; estabelecerá um acordo com o rei e dar-lhe-á por esposa a própria filha, a fim de introduzir a ruína neste país; isto, porém, não resultará e este reino não lhe há de pertencer.

11:18  *Depois, voltar-se-á para as ilhas, muitas das quais tomará. Mas um magistrado porá termo à sua soberba e lhe fará pagar a injúria.

11:19  *Então, dirigir-se-á às fortalezas da própria nação; mas vacilará, cairá e acabará por desaparecer.

11:20  *Será estabelecido, no lugar deste último, um príncipe que mandará um emissário ao país que é a nação gloriosa. Em alguns dias será abatido. E isto não será por efeito nem da cólera, nem da batalha.»

11:21  *«Em lugar dele, levantar-se-á um homem desprezível, nunca chamado à dignidade real, mas que virá inesperadamente e se há de apoderar da realeza por intrigas.

11:22  *Serão dominados e desmantelados por ele os exércitos que deviam vencer, bem como um príncipe da aliança.

11:23  Desprezando o acordo feito com ele, atuará pela traição. Pôr-se-á em marcha e vencerá com poucos homens.

11:24  *Subitamente, invadirá as mais ricas regiões do país; fará o que não terão feito os seus pais nem os pais dos pais: distribuirá pela sua gente o que saquear – despojos e riquezas – e fará projetos de ofensivas contra as fortalezas, mas só até um certo tempo.

11:25  *À frente de um grande exército, incitará a sua força e coragem contra o rei do Sul. Por sua vez, o rei do Sul envolver-se-á na luta com um exército numeroso e muito forte, mas não poderá resistir, em virtude das conjuras maquinadas contra ele.

11:26  Os que com ele comem finas iguarias hão de arruiná-lo, debandará o exército e muitos homens cairão feridos de morte.

11:27  *Os dois reis, de coração cheio de desejos malévolos, procurarão enganar-se um ao outro em torno da mesma mesa. Os seus projetos, porém, serão mal sucedidos, visto que o fim tem a sua hora determinada.

11:28  *Regressará com grandes riquezas ao seu país. O seu coração decidiu-se pelo mal contra o povo santo; fá-lo-á e, depois, regressará ao seu país.

11:29  *No tempo marcado, de novo atacará o Sul, mas esta outra expedição não será como a primeira.

11:30  *Navios de Kitim virão contra ele e perderá a coragem. Voltará novamente o seu furor contra a aliança santa, contra a qual tomará medidas, realizando um acordo com os que a tiverem abandonado.

11:31  *Exércitos, sob a chefia do próprio rei, virão profanar o santuário e a fortaleza; acabarão com o sacrifício perpétuo e estabelecerão a abominação devastadora.

11:32  Pela lisonja levará a apostatar os que violaram a aliança, mas a multidão dos que conhecem o seu Deus permanecerá firme e há de resistir.

11:33  *Os homens sensatos deste povo hão de instruir um grande número; porém, sucumbirão pela espada e pelo fogo, pelo cativeiro e pilhagem, durante um certo tempo.

11:34  *Quando sucumbirem, serão poucos os que os hão de socorrer e muitos se juntarão a eles por hipocrisia.

11:35  *Muitos destes sensatos perecerão, a fim de que sejam provados, purificados e tornados brancos até ao termo final, porquanto este fim não chegará senão em tempo marcado.

11:36  *O rei agirá em tudo conforme lhe aprouver. Encher-se-á de orgulho, considerar-se-á acima de todos os deuses; proferirá mesmo coisas inauditas contra o Deus dos deuses; prosperará até que a cólera divina tenha chegado ao termo, porque o que está decretado há de cumprir-se.

11:37  *Não terá consideração pelos deuses de seus pais, nem pelo deus querido das mulheres, nem por qualquer divindade; julgar-se-á superior a todos.

11:38  *Em lugar deles, honrará o deus das fortalezas e, com ouro, prata, pedras preciosas e jóias, honrará um deus desconhecido do país dele.

11:39  Com a ajuda de um deus estranho, atacará as muralhas das fortalezas; àqueles que o reconheceram cumulará de honras, dar-lhes-á autoridade sobre um grande número de súbditos e lhes distribuirá terras como recompensa.»

11:40  *«Por ocasião do fim, o rei do Sul se levantará contra ele. O rei do Norte desabará sobre o mesmo como um furacão, com carros, cavaleiros e considerável frota. Entrará nos territórios como torrente que transborda.

11:41  *Invadirá a nação gloriosa, na qual muitos homens tombarão. Todavia, os edomitas, os moabitas e a maior parte dos amonitas escapar-lhe-ão.

11:42  Meterá a mão em diferentes países e o Egito não lhe fugirá.

11:43  Apoderar-se-á dos tesouros de ouro e de prata e de tudo o que há de precioso no Egito. Os líbios e os etíopes hão de juntar-se a ele.

11:44  *Contudo, alarmado pelas notícias chegadas do Oriente e do Norte, retirar-se-á furiosíssimo, com o intuito de destruir e exterminar uma grande multidão de gente.

11:45  *Levantará as tendas do seu quartel real, entre o mar e os montes da nação santa. Então, chegará o termo da sua vida e ninguém lhe prestará auxílio.»

Chapter 12

12:1  *«Naquele tempo, surgirá Miguel, o grande príncipe, que protege os filhos do teu povo. Será este um período de angústia tal, que não terá havido outro semelhante desde que existem nações até àquele tempo. Ora, entre a população do teu povo, serão salvos todos os que se encontraram inscritos no livro.

12:2  *Muitos dos que dormem no pó da terra acordarão, uns para a vida eterna, outros para a ignomínia, para a reprovação eterna.

12:3  *Os que tiverem sido sensatos resplandecerão como a luminosidade do firmamento, e os que tiverem levado muitos aos caminhos da justiça brilharão como estrelas com um esplendor eterno.

12:4  *E tu, Daniel, guarda isto em segredo e conserva selado este livro até ao tempo final. Deixa que muitos errem por aqui e por ali, mas o conhecimento crescerá.»

12:5  *Eu, Daniel, continuava a olhar. Avistei duas outras personagens que se mantinham de pé, cada qual em sua margem do rio.

12:6  *Um deles disse ao homem vestido de linho que estava por cima das águas do rio: «Para quando será o fim destas coisas prodigiosas?»

12:7  *E ouvi jurar o homem vestido de linho, que estava sobre as águas do rio, levantando ao céu a mão esquerda, assim como a mão direita: «Por aquele que vive eternamente, isto será num tempo, tempos e metade de um tempo. Primeiro, a força do povo santo há de quebrar-se inteiramente. Então, todas estas coisas se cumprirão.»

12:8  Ouvi estas palavras, mas sem as compreender, e disse-lhe: «Meu senhor, qual o fim de tudo isto?»

12:9  Respondeu: «Vai, Daniel, porque estes vaticínios devem permanecer fechados e selados até ao tempo final.

12:10  *Muitos serão purificados, aperfeiçoados e postos à prova. Os ímpios atuarão com perversidade, porém nenhum deles compreenderá, ao passo que os sensatos compreenderão.

12:11  *Desde o tempo em que for abolido o holocausto perpétuo e estabelecida a abominação devastadora, haverá mil duzentos e noventa dias.

12:12  Feliz o que permanecer na expetativa e chegar a mil trezentos e trinta e cinco dias!

12:13  *Tu, vai até ao fim e repousarás; levantar-te-ás para receber a tua parte da herança, no fim dos tempos.»

Chapter 13

13:1  *Havia um homem chamado Joaquim, que habitava na Babilónia.

13:2  Tinha desposado uma mulher de nome Susana, filha de Hilquias, muito bela e piedosa para com o Senhor,

13:3  pois tinha sido educada pelos pais, que eram justos, de harmonia com a Lei de Moisés.

13:4  Joaquim era muito rico. Contíguo à sua casa, tinha um pomar; e com frequência se reuniam em casa dele os judeus, pois que entre todos os seus compatriotas gozava de particular consideração.

13:5  *Tinham sido nomeados juízes, naquele ano, dois anciãos do povo. A eles justamente se aplicava a palavra do Senhor: «A iniquidade veio da Babilónia, de anciãos e juízes, que passavam por dirigir o povo.»

13:6  Estas duas personagens frequentavam a casa de Joaquim, onde vinham procurá-los todos os que tinham qualquer contenda.

13:7  À hora do meio-dia, quando toda esta gente se tinha retirado, Susana ia passear para o jardim do marido.

13:8  Os dois anciãos viam-na todos os dias, por ocasião do passeio, de maneira que a sua paixão se acendeu por ela.

13:9  Perderam a justa noção das coisas, afastaram os olhos para não olharem para o céu e não se lembrarem da verdadeira regra de conduta.

13:10  Os dois consumiam-se de paixão por Susana, mas sem contarem um ao outro a sua própria emoção.

13:11  Tinham vergonha de, reciprocamente, comunicarem o desejo que os dominava de a possuírem.

13:12  Todos os dias, inquietos, procuravam ocasião para a observar.

13:13  Uma vez, disseram um ao outro: «Vamos para casa, pois é a hora de almoçar.» Saíram cada um por seu lado.

13:14  Mas voltaram os dois atrás e encontraram-se num mesmo lugar. Ao interrogarem-se mutuamente sobre o motivo do regresso, confessaram um ao outro o seu desejo. Combinaram, então, um momento em que pudessem encontrar Susana só. Eles estudavam a ocasião propícia.

13:15  Um dia, como de costume, chegou Susana, acompanhada apenas por duas criadas, e preparava-se para tomar banho no jardim, pois fazia calor.

13:16  Não havia aí ninguém senão os dois anciãos que, escondidos, a espiavam.

13:17  Disse às jovens: «Trazei-me óleo e unguentos e fechai as portas do jardim, para eu tomar banho.»

13:18  Fizeram o que ela tinha mandado e, tendo fechado as portas do jardim, saíram pela porta traseira, para irem procurar o que lhes tinha sido pedido; não sabiam que os anciãos estavam lá escondidos.

13:19  Logo que elas saíram, os dois homens precipitaram-se para junto de Susana

13:20  e disseram-lhe: «As portas do jardim estão fechadas, ninguém nos vê. Nós ardemos de desejo por ti. Aceita e entrega-te a nós.

13:21  Se não quiseres, vamos denunciar-te. Diremos que um rapaz estava contigo e que foi por isso mesmo que tu mandaste embora as criadas.»

13:22  *Susana bradou angustiada: «Estou sujeita a aflições de todos os lados! Se faço isso, é para mim a morte. Se não o faço, nem mesmo assim vos escaparei.

13:23  *Mas é preferível para mim cair em vossas mãos sem ter feito nada, do que pecar aos olhos do Senhor.»

13:24  Susana, então, soltou altos gritos e os dois anciãos gritaram também com ela.

13:25  E um deles, correndo para as portas do jardim, abriu-as.

13:26  As pessoas da casa, ao ouvirem esta gritaria, precipitaram-se pela porta traseira para ver o que tinha acontecido.

13:27  Logo que os anciãos falaram, os criados coraram de vergonha, pois jamais se tinha dito coisa semelhante de Susana.

13:28  No dia seguinte, os dois anciãos, dominados pelo desejo criminoso contra a vida de Susana, vieram à reunião que tinha lugar em casa de Joaquim, seu marido.

13:29  Disseram diante de toda a gente: «Que se vá procurar Susana, filha de Hilquias, a mulher de Joaquim!» Foram procurá-la.

13:30  E veio com os seus pais, os filhos e os membros da sua família.

13:31  Susana era de figura delicada e bela de rosto.

13:32  *Porque estava velada, estes homens perversos, para ao menos se saciarem com a sua beleza, exigiram que levantasse o véu.

13:33  Choravam todos os seus, assim como todos os que a conheciam.

13:34  *Os dois anciãos levantaram-se diante de todo o povo e puseram a mão sobre a cabeça de Susana,

13:35  enquanto ela, desfeita em lágrimas, mas de coração cheio de confiança no Senhor, olhava para o céu.

13:36  Disseram então os anciãos: «Quando passeávamos a sós pelo jardim, entrou ela com duas criadas; e depois de ter fechado as portas, mandou embora as criadas.

13:37  Então, um jovem, que estava lá escondido, aproximou-se e pecou com ela.

13:38  Encontrávamo-nos a um canto do jardim. Perante semelhante atrevimento, corremos para eles e surpreendemo-los em flagrante delito.

13:39  Não pudemos ter mão no rapaz, porque era mais forte do que nós, abriu a porta e escapou-se.

13:40  A ela apanhámo-la; mas, quando a interrogámos para saber quem era esse rapaz,

13:41  recusou responder-nos. Somos testemunhas disto.» Dando crédito a estes homens, que eram anciãos e juízes do povo, a assembleia condenou Susana à morte.

13:42  Esta, então, em altos brados disse: «Deus eterno, que sondas os segredos, que conheces os acontecimentos antes que se deem,

13:43  Tu sabes que proferiram um falso testemunho contra mim. Vou morrer sem ter feito nada daquilo que maldosamente inventaram contra mim.»

13:44  Deus ouviu a sua oração.

13:45  *Quando a conduziam para a morte, o Senhor despertou a alma límpida de um rapazinho, chamado Daniel,

13:46  *que gritou com voz forte: «Estou inocente da morte dessa mulher!»

13:47  Toda a gente se voltou para ele e disse: «Que é que isso quer dizer?»

13:48  E, dirigindo-se para o meio deles, afirmou: «Israelitas! Estais loucos, para condenardes uma filha de Israel, sem examinardes nem reconhecerdes a verdade?

13:49  Recomeçai o julgamento, porque é um falso testemunho o que estes dois homens declararam contra ela.»

13:50  *O povo apressou-se a voltar. Os anciãos disseram a Daniel: «Vem, senta-te no meio de nós e esclarece-nos, porque Deus te deu maturidade!»

13:51  Bradou Daniel: «Separai-os para longe um do outro e eu os julgarei.»

13:52  Separaram-nos. Daniel, então, chamou o primeiro e disse-lhe: «Velho perverso! Eis que se manifestam agora os pecados que cometeste outrora em julgamentos injustos,

13:53  *ao condenares os inocentes, absolvendo os culpados, quando o Senhor disse: ‘Não farás com que morra o inocente ou o justo.’

13:54  Vamos! Se realmente os viste, diz-nos debaixo de que árvore os viste entreterem-se um com o outro.» «Sob um lentisco.» – respondeu.

13:55  Retorquiu Daniel: «Pois bem! Aí está a mentira, que pagarás com a tua cabeça. Eis que o anjo do Senhor, conforme a sentença divina, te vai rachar a meio!»

13:56  Afastaram o homem, e Daniel mandou vir o outro e disse-lhe: «Tu és um filho de Canaã e não um judeu. Foi a beleza que te seduziu e a paixão que te perverteu.

13:57  *É assim que sempre tendes procedido com as filhas de Israel, que, por medo, entravam em relação convosco. Uma filha de Judá, porém, não consentiu na vossa perversidade.

13:58  Vamos, diz-me: sob que árvore os surpreendeste em atitude de se unirem?» «Sob um carvalho.»

13:59  *Respondeu Daniel: «Pois bem! Também tu forjaste uma mentira que te vai custar a vida. Eis que o anjo do Senhor, de espada em punho, se dispõe a cortar-te ao meio, para vos aniquilar.»

13:60  Logo a multidão deu grandes brados, e bendizia a Deus que salva os que põem nele a sua esperança.

13:61  Toda a gente, então, se insurgiu contra os dois anciãos que Daniel tinha convencido de falso testemunho, pelas suas próprias declarações e deu-se-lhes o mesmo tratamento que eles tinham infligido ao seu próximo.

13:62  *De harmonia com a Lei de Moisés, mataram-nos. Deste modo, foi poupada naquele dia uma vida inocente.

13:63  Hilquias e sua esposa louvaram a Deus por sua filha, Susana, com Joaquim, esposo dela, e todos os parentes, pois não tinham encontrado qualquer desonestidade na sua conduta.

13:64  Daniel, daí em diante, gozou de elevada consideração entre os compatriotas.

Chapter 14

14:1  *Pela morte do rei Astiages, Ciro, o Persa, subiu ao trono.

14:2  Daniel vivia com o rei e era honrado mais que todos os outros amigos do rei.

14:3  *Havia entre os babilónios um ídolo chamado Bel, para o qual diariamente se despendiam doze artabas de farinha, quarenta carneiros e seis medidas de vinho.

14:4  O rei prestava culto ao ídolo e todos os dias o ia adorar. Daniel, porém adorava o seu Deus.

14:5  *O rei disse-lhe: «Porque não adoras Bel?» Respondeu Daniel: «Porque não venero um ídolo feito pela mão do homem, mas sim o Deus vivo, que criou o céu e a terra e que exerce o seu domínio sobre todos os seres humanos.»

14:6  Retorquiu o rei: «Por isso, então, Bel não te parece que seja um deus vivo! Não vês quanto ele come e bebe todos os dias?»

14:7  Daniel pôs-se a rir e respondeu: «Desengana-te, ó rei; este deus, por dentro, é de barro, por fora, de bronze e nunca comeu nem bebeu.»

14:8  O rei, irritado, chamou os sacerdotes de Bel e disse-lhes: «Se não me indicais quem come estas oferendas, morrereis. Ao contrário, se me provardes que é Bel quem as come, morrerá Daniel, porque blasfemou contra ele!»

14:9  «Seja como tu dizes!» – respondeu Daniel ao rei. Eram setenta os sacerdotes de Bel, sem contar as mulheres e os filhos.

14:10  O rei foi ao templo de Bel na companhia de Daniel.

14:11  Os sacerdotes disseram: «Nós vamos sair. Manda trazer, ó rei, os alimentos e o vinho misturado; depois, fecha a porta e sela-a com o teu anel. Se, amanhã de manhã, quando entrares no templo, verificares que não foi tudo comido por Bel, morreremos; de outro modo, isso acontecerá a Daniel, que nos caluniou.»

14:12  Estavam perfeitamente seguros, porque debaixo da mesa tinham feito uma abertura oculta, pela qual entravam todos os dias e levavam as oferendas.

14:13  Depois que saíram, logo que o rei depôs os alimentos diante de Bel,

14:14  Daniel mandou aos servos trazer cinza, que espalhou por todo o templo, em presença apenas do rei. Em seguida, saíram, fecharam a porta e, depois de lhe ter aposto o selo real, afastaram-se.

14:15  Durante a noite, como de costume, entraram os sacerdotes com as mulheres e os filhos e comeram e beberam tudo.

14:16  Ao romper do dia, veio o rei e Daniel com ele.

14:17  «Estão intactos os selos, Daniel?» – perguntou o rei. Respondeu Daniel: «Estão intactos, ó rei.»

14:18  Logo que abriu a porta e olhou para a mesa, o rei exclamou em voz alta: «Tu és grande, Bel. Não nos enganaste.»

14:19  Daniel, porém, pôs-se a rir e, impedindo que o rei fosse mais para a frente, disse-lhe: «Observa o pavimento. De quem são estas pegadas?»

14:20  «Vejo, na verdade – respondeu o rei – pegadas de homens, de mulheres e de crianças.»

14:21  Irritado, o rei mandou prender os sacerdotes, com suas mulheres e filhos e os mesmos lhes mostraram a entrada secreta por onde se introduziam, a fim de consumirem o que estava sobre a mesa.

14:22  Mandou-os matar e entregou Bel à vontade de Daniel que o destruiu, a ele e ao seu templo.

14:23  Havia também um grande dragão, que os babilónios veneravam.

14:24  Disse o rei a Daniel: «Pretenderás tu, também, que aquele seja de bronze? Vive, come e bebe. Não podes negar que este seja um deus vivo. Portanto, adora-o.» Retorquiu Daniel:

14:25  «Eu não adoro senão o Senhor, meu Deus, porque Ele é um Deus vivo. Dá-me licença, ó rei, e sem espada nem pau eu matarei o dragão.»

14:26  Respondeu o rei: «Eu ta concedo.»

14:27  Daniel, então, pegou em pez, sebo e pêlos; mandou cozer tudo junto e, com isto, preparou bolos que atirou para a goela do dragão, o qual rebentou. E Daniel exclamou: «Aí está o que vós venerais!»

14:28  Ao sabê-lo, os babilónios irritaram-se muito; revoltaram-se contra o rei ao grito de: «O rei fez-se judeu! Destruiu Bel, matou o dragão e massacrou os sacerdotes.»

14:29  Vieram ter com o rei para lhe dizerem: «Entrega-nos Daniel ou matar-te-emos, a ti e à tua família.»

14:30  Perante a violência com que o ameaçavam, o rei viu-se forçado a entregar-lhes Daniel,

14:31  a quem lançaram na cova dos leões, onde ficou seis dias.

14:32  Havia na cova sete leões aos quais diariamente davam dois cadáveres e dois carneiros. Mas daquela vez não lhes deram nada, para que devorassem Daniel.

14:33  Ora, por aquela ocasião, vivia na Judeia o profeta Habacuc. Acabava de cozer uma papa e migava pão numa caçarola e ia ao campo levá-la aos ceifeiros.

14:34  Porém, um anjo do Senhor disse-lhe: «Leva esta refeição à Babilónia, a Daniel que se encontra na cova dos leões.»

14:35  Respondeu Habacuc: «Senhor, eu nunca vi Babilónia e não conheço essa cova.»

14:36  *Então o anjo agarrou-o pelo alto da cabeça e levou-o pelos cabelos, num sopro, até à Babilónia, por cima da cova.

14:37  Bradou Habacuc: «Daniel, Daniel, aceita a refeição que Deus te envia.»

14:38  E Daniel respondeu: «Oh! Deus, que pensaste em mim! Não abandonaste os que te amam!»

14:39  Daniel levantou-se e comeu, enquanto o anjo do Senhor reconduzia Habacuc a sua casa.

14:40  Ao sétimo dia, o rei veio para chorar Daniel. Ao chegar junto da cova, olhou para dentro e ali viu Daniel sentado.

14:41  E gritou: «Tu és grande, Senhor, Deus de Daniel! Não há qualquer outro Deus senão Tu!»

14:42  Mandou tirá-lo da cova dos leões e lançar nela todos os que tinham pretendido eliminá-lo. À sua vista, foram imediatamente devorados.

14:43  *O rei disse então: «Que todos os habitantes da terra temam o Deus de Daniel, pois é Ele o Salvador que opera maravilhas e prodígios sobre a terra; foi Ele quem libertou Daniel da cova dos leões!»